O terrorismo é complicado.
É particularmente difícil de aceitar, é difícil de controlar, mas é sobretudo difícil de compreender.
Para começar é preciso compreender que o Terrorismo já existe há muito tempo.
Sem sequer entrar em aspectos mais antigos, basta saber que o termo Terrorismo surge pela primeira vez em França, em 1793 depois da Revolução Francesa, durante o
Reino de Terror. Durante este período o Governo Francês guilhotinou ou executou sumariamente dezenas de milhares de pessoas, sob o pretexto de que eram de alguma forma contra as convicções ideológicas do governo.
Em 1896 Sergey Nechayev, fundador do grupo revolucionário "Retribuição do Povo" que acreditava que a revolução devia ser conseguida a qualquer custo, incluindo a violência contra inocentes, descrever-se ia a si mesmo como um "Terrorista".
É dele que vem a concepção que temos actualmente do Terrorismo como o assassinato de inocentes, com um fim político, de uma maneira que crie um espectáculo mediático.
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Espectáculo Mediático |
Enquanto via, estupefacto, cada vez mais notícias a virem de Paris, à medida que via o número de mortos a subir, enquanto lia os testemunhos da violência e do terror que aquelas pessoas tinham vivido, os meus sentimentos de tristeza misturavam-se com a revolta face a esta matança sem sentido.
É tão estúpido. Tão incompreensível.
Questionei-me várias vezes porquê.
Porque é que o ISIS faria isto? Porquê atacar uma capital europeia?
Sabemos que o fanatismo religioso, a ignorância e as péssimas condições sócio económicas na Síria e no Iraque estão na base destes ataques, mas qual é o objectivo? O que é que a ISIS tem a ganhar, perguntava-me eu.
O que é que eles têm a ganhar?
Porque tanto quanto eu conseguia perceber, a única coisa que tinham conseguido era pintar um enorme alvo nas suas próprias costas!
Porque quando morrem estupidamente pessoas inocentes em ataques violentos, a reacção normal é a raiva! A reacção emocional imediata vai ser de agredir de volta!
É normal! É naturalmente humano. Foi o que eu senti!
É uma reacção fácil de compreender, de justificar e de defender.
É absolutamente expectável e previsível.
E foi exactamente o que aconteceu.
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Aviões franceses a partirem da base nos Emiratos Árabes Unidos |
Absolutamente expectável e previsível.
Agora, o ISIS pode ser muitas coisas, e já lhes chamaram muitas coisas, mas Estúpidos não tem sido uma delas.
Se era previsível para nós, era previsível para o ISIS.
E se era previsível para o ISIS, isso significa que não teriam planeado o ataque em primeiro lugar se não estivessem a contar com isso.
Que mais é que é previsível? Mais bombardeamentos, mais tropas em terreno difícil a travar uma guerra de guerrilha sangrenta, milhares de Euros e Dólares gastos, tensão política e social.
É este o objectivo do Terrorismo.
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Espectáculo Mediático |
É por isso que eles se filmam a si mesmos a cortarem cabeças e depois põem os vídeos na internet! Para nos provocarem à acção emocional, súbita, violenta e sobretudo dispendiosa.
Depois do ataque ao Charlie Hebdo,
França implementou leis de vigilância que lhes permitiam ouvir chamadas telefónicas e ler e-mails sem permissão dos tribunais, com o intuito de prevenir ataques terroristas.
Claramente não funcionou.
Basta verem no facebook as discussões comezinhas sobre se é válido ou não pôr uma bandeira francesa por cima do perfil ou não.
Medo e pânico a provocarem desestabilização social, limitações às liberdades individuais, a promoverem crimes contra a humanidade.
Tudo previsível.
Bombas a caírem no Médio Oriente fazem parte do plano do ISIS. Não vão mudar nada.
O plano do Terrorismo é obrigar-nos a reagir violentamente, de maneira a que essa violência seja a nossa auto-destruição.
O Terrorismo é complicado.
Se pensarmos de maneira fria, a Europa está a preparar-se para receber dezenas de milhares de migrantes do Médio Oriente, e começava a parecer às populações Islâmicas que fogem da guerra, um destino possível, uma zona de paz, pluralista e tolerante, uma alternativa ao Islão radical e à guerra permanente.
Estes atentados parecem inúteis, mas servem o propósito de arrefecer muito o entusiasmo da Europa na recepção aos migrantes (
Isto aconteceu em setembro. Acham que uma coisa semelhante seria possível hoje ou amanhã?), ao mesmo tempo que lembram aos migrantes que a Europa Ocidental pode ser sanguinária a um ponto comparável ao ISIS.
Ou acham que há uma grande diferença, para alguém que perdeu um membro da família, se essa pessoa foi morta por um jihadista de kalashnikov ou por uma bomba francesa? Podemos argumentar que a intenção das bombas francesas não é matar inocentes, mas sabemos que isso acontece.
Os americanos enganaram-se, e bombardearam um hospital dos médicos sem fronteiras no Afeganistão. O mês passado! As vítimas inocentes do Terrorismo intencional estão tão mortas como os vítimas acidentais, mas inocentes, dos bombardeamentos. E são surdas às nossas distinções semânticas e declarações de intenção, em como só queríamos matar Terroristas.
Eu não sei o que motiva uma pessoa a matar o máximo de inocentes antes de morrer uma morte certa, mas imagino que perder a família num bombardeamento possa ser, pelo menos, um factor de risco.
Assim, os nossos bombardeamentos podem ser uma boa campanha para reforçar a base de apoio ao ISIS na região. O ISIS quer mostrar que a Europa não é uma alternativa, é o Inimigo.
Se não formos espertos, eles vão conseguir.
Eu sei, não é fácil... não podemos ficar de braços cruzados, mas as acções mais imediatas são claramente auto-destrutivas e contraproducentes.
Não tenho nenhuma solução para isto. Eu é mais bolos, não percebo o suficiente de estratégia militar, geo-política e sociologia para dizer qual é a melhor solução.
Mas cheira-me que matar mais pessoas não uma delas.
Nota: eu gostava de ser muito esperto, mas não sou, e muitas das opiniões neste post são directamente inspiradas no podcast do Dan Carlin sobre este assunto, que podem ouvir
aqui.