Pataniscas Satânicas

Pataniscas Satânicas

terça-feira, 26 de julho de 2016

Pensamentos sobre Londres II

Portanto hoje tenho de escrever um texto em 90 minutos, antes de ir trabalhar. Fui a Londres este fim de semana.

Vamos falar sobre isso.


Grandes decisões, planeadas durante meses, antecipadas durante anos, tiveram fruição recentemente.

Aquele tipo de escolhas que começam por ser emocionais, depois passam por crivos e provas de racionalização até que a insegurança associada a elas seja pelo menos apaziguada por um verniz de planeamento, que depois é a única coisa que as sustenta face a novas emoções que nos fazem querer fugir do terror da mudança.

Por força das circunstâncias dei por mim em Londres na semana passada. Por forças maiores ainda, os motivos burocráticos que me levaram lá resolveram-se inesperadamente cerca de 2 horas depois de ter aterrado.

E subitamente dei por mim sozinho em Londres, com 3 dias pela frente e nenum plano sobre como gastar esses dias.


Decisão número 1, comer.

Não se tomam segundas decisões de barriga vazia, e eu não tinha comido o pequeno almoço essa manhã, de tão nervoso que estava.

(há uma implicita Decisão 0, que é urinar - é impossível tomar outras decisões quando é imperativamente necessário urinar)

Felizmente o Hostel onde eu estava fazia uns hamburgers gigantes.


Pronto, com isso resolvido, virei-me para a tarefa em mãos: inventar coisas para fazer em Londres durante 72 horas.
Não devia ser uma tarefa difícil.

Não foi!

Se houve um problema foi haverem demasiadas escolhas. O problema era então como escolher.

Eu já tinha estado em Londres duas vezes no passado.

A primeira vez está carregadíssima de emoções, nos extremos da positividade e negatividade, e foi relativamente bem registada aqui e aqui.

A segunda vez foi igualmente importante, sobretudo positiva, muito mais registada, mas menos publicamente. Não a encontram na internet em lado nenhum (acho eu, o Google consegue tudo).

Nesta terceira vez, como disse, estava sozinho. Podia fazer tudo o que eu quisesse, só tinha de me satisfazer a mim mesmo, não tinha de conciliar os gostos e preferências de mais ninguém.


Banda-Desenhada, portanto.

Obviamente.

Excessivamente, poderiam alguns dizer.

Visitei 4 lojas de BD, um Museu do Cartoon, e uma loja de Jogos e RPGs. Ainda fui à procura de mais duas, mas quando lá cheguei estavam fechadas.

Contrariamente ao que eu tinha dito num daqueles posts anteriores, Londres é uma excelente cidade para BD, jogos e wargaming.
É impressionante a quantidade de gente que estava em qualquer um destes lugares, o entusiasmo que toda a gente mostrava. As roupas e os acessórios que mostrava lealdade a um herói, ou devoção a uma BD, ou paixão por um filme.

Senti-me em casa em qualquer um destes sítios.


Fui à procura do invulgar e encontrei-o no Grant's Museum of Zoology.

Uma relíquia em si mesmo, o Museu é um artefacto de uma era em que ninguém tinha problemas morais em simplesmente encher um frasco gigante com fetos de coelhos, preservá-los com formaldeído para que algum aluno a estudar Anatomia Comparativa pudesse ir lá tirar um para o dissecar.

Senti-me transportado para uma Lodnres Vitoriana, rodeado de esqueletos, animais empalhados e corpos bizarros em frascos. Haviam esqueletos de babuínos e de dugongos, jarros com insectos extintos, fósseis de alforrecas.

Really, you had to be there...




Por vezes eu nem tinha de ir atrás das coisas. Elas simplesmente vinham ter comigo.

Um dos encontros profissionais que tive levou-me à estação de King's Cross. O nome era-me familiar por várias razões, algumas das quais eu estava a ter dificuldade em identificar, até que, quase acidentalmente, me deparei com isto:

Não sou eu na foto.
Sim, claro, obviamente, como é que me podia ter esquecido.

Houve muitas mais coisas em Londres.

Um dos exemplares mais antigos que existem do Beowulf original, escrito em Old English, a 6 metros de letras originais dos Beatles, na British Library.



Réplicas de foguetões, satélites, módulos de aterragem lunar, pedras da Lua genuínas, e uma convenção de retro-gaming, no Science Museum.

The Eagle
Aquilo é um míssil V2 verdadeiro lá ao fundo - é ENORME
Uma pedra da lua
Joguei o Pong original, no computador à esquerda
Uma avózinha coreana a dominar Super Mario
Encontrei lojas de brinquedos de 6 andares, do género que eu já não via desde o Japão, com tantos, mas tantos, mas tantos Legos no último andar.

(e vocês sabem que este post está quase a chegar ao fim quando os blocos de texto ficam mais pequenos e as imagens aumentam em número porque vocês têm um attention span de adolescentes viciados em 7 plataformas de partilha social ao mesmo tempo)

Hamley's
Big Bang Theory
Um versão gigante de uma versão mini de um X-Wing - porque não?
E a comida. A comida em Londres é tão boa!

Qualquer supermercado barato tinha dezenas de saladas e sanduíches saudáveis e deliciosas à escolha!

Por contraste, os supermercados portugueses especializam-se todos em bacalhau e couves.

Pizza da Homeslice, no Neal's Yard
Inevitavelmente introduzimos as coisas que nos acontecem na nossa própria narrativa pessoal.

É mesmo assim que funciona.

Esta viagem acabou por se tornar intensamente pessoal. Estava bom tempo, andei imenso.
Obrigar-me a fazer uma peregrinação por todas as lojas de BD que encontrei em Londres foi uma maneira fantástica de passar por ruas e espaços que nunca teria encontrado acidentalmente,

Fiquei contente. Fiquei entusiasmado por Londres e pelo que o Reino Unido tem para oferecer.

E era mesmo disso que eu estava a precisar agora.
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terça-feira, 19 de julho de 2016

As Drogas no seu Cérebro

Sal no cérebro? A Consciência é uma coisa física? As moléculas que mandam na nossa cabeça?

Vamos falar sobre isso


Já alguma vez se sentiu triste?

E feliz?

São emoções complexas, difíceis de definir sem ser em termos polarizados de "bom" e "mau". São provocadas por um conjunto igualmente difícil de contabilizar de factores, passando pela nossa infância, as nossas relações inter-pessoais, a nossa situação social, laboral e económica, incluindo aquilo que comemos (ou não) ao pequeno-almoço.

É compreensível que estas emoções sejam entendidas como coisas abstractas, que não existem propriamente num mundo físico, atingível.

É por isso que para muita gente os anti-depressivos e outros psico-fármacos pareçam funcionar como por magia, e induzam tanta desconfiança.


Esta noção deriva do nosso próprio desconhecimento de como funciona a consciência humana.

No geral, continuamos a sentir que a consciência é uma coisa etérea e muito abstracta, que anda a flutuar vagamente relacionada com o nosso cérebro.

Porque se perguntarmos "Onde é que está aquele pensamento sobre patinhos?" não podemos simplesmente apontar para o cérebro e dizer "Está ali!".

Essa pergunta não faz sentido da mesma maneira que não faz sentido apontar para a placa electrónica de uma calculadora e perguntar "Onde é que está o cálculo 2+2=4?".

Está em todo o lado e não está em nenhum.


Porque a consciência é uma qualidade emergente de sistemas extremamente complexos. É maior do que a soma das suas partes. Mas a verdade é que a consciência continua a basear-se em coisas tão concretas, mecânicas e palpáveis como moléculas.

Só para dar um exemplo simples um dos elementos mais fundamentais para a condução impulsos nervosos é o sódio.

Sim, a mesma coisa que pomos em cima das batatas fritas é também uma das moléculas mais fundamentais para o funcionamento da nossa consciência.

Às moléculas que modulam e transmitem informação entre neurónios chamamos neurotransmissores. São moléculas complexas, e conhecemos bem várias delas.

Algumas das mais importantes (que conhecemos) são o Glutamato, o GABA, a Dopamina, a Epinefrina, a Serotonina, a Acetilcolina e as Endorfinas, entre outras.



Se alguma vez se sentiu triste, feliz, zangado, excitado ou desmotivado, isso provavelmente estava relacionado com alguma destas moléculas.

E o que é mais fascinante, e prova definitiva de que a nossa consciência é uma coisa física, é que podemos alterar a consciência recorrendo a outras moléculas igualmente físicas.



Está triste? Tome lá uma molécula que lhe sobe a Serotonina

Está demasiado excitado, tome uma molécula que inibe os efeitos excitatórios da Epinefrina!

Está sem motivação? Dopamina!


A maior parte dos psicofármacos disponíveis em Portugal, sejam antidepressores, ansiolíticos, hipnóticos, antipsicóticos, antiparkinsónicos, antiepiléticos ou analgésicos, actuam sobre estestes neurotransmissores de que temos estado a falar.

O que é interessante, e óbvio em retrospectiva, é que naturalmente não são só estes 6 ou 8 neurotransmissores que fazem a nossa consciência.

Não sabemos quantos são.

Sabemos que são mais de 100, e todos os anos descobrimos mais.

E não sabemos o que fazem a maior parte deles.

Nem como interagem.

CategoryNameAbbreviationMetabotropicIonotropic
Small: Amino acids (Arg)Agmatineα2 adrenergic receptorImidazoline receptorNMDA receptor
Small: Amino acidsAspartateAspNMDA receptor
Small: Amino acidsGlutamate (glutamic acid)GluMetabotropic glutamate receptorNMDA receptor (co-agonist),Kainate receptorAMPA receptor
Small: Amino acidsGamma-aminobutyric acidGABAGABAB receptorGABAAGABAA-ρ receptor
Small: Amino acidsGlycineGlyGlycine receptorNMDA receptor (co-agonist)
Small: Amino acidsD-serineSerNMDA receptor (co-agonist)
Small: AcetylcholineAcetylcholineAchMuscarinic acetylcholine receptorNicotinic acetylcholine receptor
Small: Monoamine (Phe/Tyr)DopamineDADopamine receptor
Small: Monoamine (Phe/Tyr)Norepinephrine(noradrenaline)NE, NAdAdrenergic receptor
Small: Monoamine (Phe/Tyr)Epinephrine(adrenaline)Epi, AdAdrenergic receptor
Small: Monoamine (Trp)Serotonin (5-hydroxytryptamine)5-HTSerotonin receptor, all but 5-HT35-HT3
Small: Monoamine (Trp)MelatoninMelMelatonin receptor
Small: Monoamine (His)HistamineHHistamine receptor
Small: Trace amine (Phe)PhenethylaminePEATrace amine-associated receptorshTAAR1hTAAR2
Small: Trace amine (Phe)N-methylphenethylamineNMPEAhTAAR1
Small: Trace amine (Phe/Tyr)TyramineTYRhTAAR1hTAAR2
Small: Trace amine (Phe/Tyr)OctopamineOcthTAAR1
Small: Trace amine (Phe/Tyr)SynephrineSynhTAAR1
Small: Trace amine (Phe/Tyr)3-methoxytyramine3-MThTAAR1
Small: Trace amine (Trp)TryptaminehTAAR1, various 5-HT receptors
Small: Trace amine (Trp)N-methyltryptamineNMThTAAR1, various 5-HT receptors,
NeuropeptidesN-AcetylaspartylglutamateNAAGMetabotropic glutamate receptors; selective agonist of mGluR3
PP: GastrinsGastrin
PP: GastrinsCholecystokininCCKCholecystokinin receptor
PP: NeurohypophysealsVasopressinAVPVasopressin receptor
PP: NeurohypophysealsOxytocinOTOxytocin receptor
PP: NeurohypophysealsNeurophysin I
PP: NeurohypophysealsNeurophysin II
PP: Neuropeptide YNeuropeptide YNYNeuropeptide Y receptor
PP: Neuropeptide YPancreatic polypeptidePP
PP: Neuropeptide YPeptide YYPYY
PP: OpioidsCorticotropin(adrenocorticotropic hormone)ACTHCorticotropin receptor
PP: OpioidsEnkephalineδ-opioid receptor
PP: OpioidsDynorphinκ-opioid receptor
PP: OpioidsEndorphinμ-opioid receptor
PP: OrexinsOrexin AOX-AOrexin receptor
PP: OrexinsOrexin BOX-BOrexin receptor
PP: SecretinsSecretinSecretin receptor
PP: SecretinsMotilinMotilin receptor
PP: SecretinsGlucagonGlucagon receptor
PP: SecretinsVasoactive intestinal peptideVIPVasoactive intestinal peptide receptor
PP: SecretinsGrowth hormone-releasing factorGRF
PP: SomatostatinsSomatostatinSomatostatin receptor
SS: TachykininsNeurokinin A
SS: TachykininsNeurokinin B
SS: TachykininsSubstance P
PP: OtherCocaine and amphetamine regulated transcriptCARTUnknown Gi/Go-coupled receptor[12]
PP: OtherBombesin
PP: OtherGastrin releasing peptideGRP
GasNitric oxideNOSoluble guanylyl cyclase
GasCarbon monoxideCOHeme bound to potassium channels
Small: EndocannabinoidAnandamideAEACannabinoid receptor
Small: Endocannabinoid2-Arachidonoylglycerol2-AGCannabinoid receptor
Small: Endocannabinoid2-Arachidonyl glyceryl ether2-AGECannabinoid receptor
Small: EndocannabinoidN-Arachidonoyl dopamineNADACannabinoid receptorTRPV1
Small: EndocannabinoidVirodhamineCannabinoid receptor
PurineAdenosine triphosphateATPP2YP2X
PurineAdenosineAdoAdenosine receptor
(esta lista está incompleta, btw)

Sim, porque não basta saber o que cada um dos neurotransmissores fazem individualmente.
Todos eles interagem uns com os outros, modulando e alterando as suas funções reciprocamente, em cadeias de acção complexas e ainda razoavelmente desconhecidas para nós.

Portanto, por um lado, é extremamente impressionante que consigamos ter um entendimento da nossa consciência e de como funciona o nosso cérebro para não só ultrapassar a ideia de que a consciência é algo etéreo e abstrato, mas também para conseguirmos artificialmente interferir na maneira como a consciência funciona, através de moléculas sintéticas.

Por outro lado, a maneira como o fazemos é ainda tão simples e básica, que dar um antidepressivo a uma pessoa é mais ou menos o equivalente a derramar um café por cima de um computador e esperar que haja um resultado diferente de 2+2=4.

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