Pataniscas Satânicas

Pataniscas Satânicas

quinta-feira, 26 de maio de 2011

Quando o Mr Magoo entrar em contramão no IP2...

Desde que mudei de local de trabalho que tenho estado responsável por fazer os exames médicos que permitem aos cidadãos comuns terem direito a renovar a carta de condução. Parece uma responsabilidade de somenos importância. E é. Mas tem nuances divertidas.

No primeiro dia, quando me explicaram sumariamente o que tinha que fazer, disseram-me repetidamente que: ''nós não estamos aqui para prejudicar as pessoa'', e ''muitas destas provas são uma formalidade'', ''nos não estamos aqui para dar lições de moral a ninguém'' e talvez mais demonstrativo: '' a única tensão que interessa é a mínima, tem que estar abaixo de 95. A máxima pode estar a 250, que passas a pessoa na mesma.'' right...
Eu não me tomo como um gajo muito rigoroso, e acho que não tenho uma atitude demasiado paternalista... Mas se me atribuirem uma tarefa, tento desempenhá-la. Até porque não há mais nada para fazer.

Até ao dia em que o senhor, vamos chamar-lhe Joaquim, de 81 anos veio renovar a carta de condução. Disse-me a funcionária: ''está lá dentro o senhor Joaquim, que é um velhote muito querido.'' Vou tentar não me perder com as objecções que se podem levantar ao conceito. Vou só dizer: os velhotes não são queridos. Um golfinho, um arco íris duplo, a hello kity - são coisas comunemente catalogadas como queridas. Um senhor que treme constantemente enquanto olha o infinito, e conta histórias circulares interrompida de vez em quando, para mastigar em seco, não é querido. É, vamos lá, um venerável no ocaso da sua vida. Todo o respeito e consideração aos idosos. Eu também quero lá chegar. Mas, se lá chegar não quero que me chamem 'querido', como se eu fosse um porquinho da índia.

Entrei na sala e saudei o senhor Joaquim. Era um velhote simpático, meio despistado e bem disposto, que, da última vez que cá tinha estado, se tinha esquecido dos óculos. Não tinha passado no exame porque tinha um acuidade visual binocular de 3/10, sem óculos. Desta vez tinha trazido dois pares de óculos e estava pronto a começar. Apontei a fila de letras que já sei de cor, correspondente a 5/10, o mínimo para poder passar-lhe o atestado. Não acertou uma. Até disse números.
Fiquei desconfortável, pedi-lhe para mudar de óculos, apontei de novo. Não senhor Joaquim, aquilo é um Z, não um M. Não, o F foi a letra anterior. Este é um H. Confrontado, reclamou que via melhor sem óculos, que só atrapalhavam. À terceira tentativa acertou metade das letras.

Dolorosamente comecei a fazer o meu papel, de dizer ao senhor Joaquim que não iria poder voltar a conduzir, e ele começou a fazer o papel dele: ''Estou perfeitamente bem, então o dr acha que eu vinha renovar a carta, se não visse nada?''. Continuei a explicar. Passámos por onde passamos sempre: '' Você sabe quantos anos tenho eu de carta? 50 anos. O Dr tem que idade? Não preciso de um bocado de papel para conduzir...'', e depois: ''Era só para ir dar uma volta ao Algarve com a mulher agora no Verão... depois já nem preciso, depois nem estou a pensar em conduzir!'' e finalmente: ''Olhe, você sabe o que eu vou fazer se não puder conduzir? rasgo a carta, queimo-a, e fico em casa.''
Contei mentalmente: negação, raiva, negociação, depressão... e nem tinham passado 15 minutos! O senhor Joaquim estava com presa. Disse-lhe que se a polícia o apanhasse sem carta era chato, ao que ele respondeu que se visse a polícia fazia-lhes um manguito, e mandava-os para a cona da mãe deles. Disse isto sempre a sorrir. Foi aqui que percebi que ter ou não carta, era o menor dos problemas do sr Joaquim.

Liguei ao chefe que me respondeu que não, se ele não tinha no mínímo 5/10, não podia passar. Disse-lhe que concordava, o sr Joaquim é que estava a ser teimoso, e... ''Espera, o sr Joaquim?'', ouvi do outro lado. ''é um velhote simpático com um braço prostético?'' sim...
''Esse senhor é um velhote muito querido, que tem muito cuidado na estrada, esqueceu-se dos óculos a última vez...'' Retorqui que mesmo com óculos ele era capaz de confundir a vizinha do rés do chão com um marco do correio. ''Pois, mas eu conheço-o ele orienta-se bem, e nós não estamos aqui para cortar as pernas a ninguém, e além disso...''. O que aconteceu a seguir é fácil de inferir.

Não percebo o conceito do velhote querido. Mas acho que é como uma criança mimada, a quem se desculpa muita coisa, porque apesar de não jogar com o baralho todo, consegue ser simpático, bem disposto, e ter aquele ar despreocupado, que nos faz a todos pensar ''quem me dera ser assim quando chegar à velhice, tão cheio de vida''.
A quem pensa assim, eu respondo: Não é vida. É demência.

E claro que preferimos todos imaginar o senhor Joaquim a ir para o Algarve com a esposa, pelo caminho encontrar a psp, e num acto perfeitamente aleatório, mandá-los todos para locais já referidos. Consigo imaginá-lo em situações absurdas e perigosas, que se resolvem para melhor através de uma combinação bem ponderada de ingenuidade, despreocupação, e muia sorte.
Porque a alternativa é imaginá-lo a entrar em contramão numa autoestrada e levar tudo à frente, sempre muito sorridente e bem disposto.
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sexta-feira, 20 de maio de 2011

O Homem que quando pede um Hamburguer, lhe trazem sempre uma Bota

Imaginem:

António está na fila para ir comprar um hamburguer. Já há muito tempo que não come um e hoje está-lhe mesmo a apetecer. Que se lixe a dieta. Vai deleitar-se com uma coisa qualquer com dois bifes, muito queijo, cebola e bacon.
Chega a sua vez, ele pede o seu hamburguer duplo com queijo e extra bacon, e num acesso de loucura, até pede as batatas fritas grandes.

Paga, e aguarda impacientemente que a rapariga com a cara cheia de acne e o olhar vazio lhe traga a sua comida.
Passados alguns minutos, e cada vez mais cheio de fome, António vê chegar a rapariga com o seu pedido. Sem nenhuma cerimónia a rapariga anuncia:
"Burger duplo de queijo, extra bacon e batatas grandes" ao mesmo tempo que deposita na bancada à frente de antónio uma grande bota.

António olha incrédulo para a bota durante uns segundos. Vira-se para a rapariga, mas percebe que do seu olhar vazio não vai obter respostas nenhumas. Volta a observar a bota velha que tem à sua frente, e só consegue pensar "Outra vez...".

António pega na sua bota e leva-a para uma mesa de onde acabaram de se levantar um casal de meia-idade que tinha ido comer sopa.
Fica uns minutos a olhar resignado para a sua bota. É uma velha bota. Não é uma bota da tropa. É uma bota daquelas que as pessoas usam no inverno. Ainda tem um pouco de lama nos atacadores. Não está estragada nem nada, mas vê-se que já foi usada.
António pondera como é que a sua vida chegou a isto.
Ele estava convencido que já tinha passado esta fase. Que já tinha ultrapassado os problemas e as dificuldades, que a sua vida estava finalmente a melhorar.
Mas afinal, ainda lhe trouxeram uma bota quando pediu um hamburguer.

António olhou para o menu iluminado do restaurante, e lá viu, realmente, em letras muito pequeninas, a seguinte mensagem "Todos os pedidos serão automaticamente substituídos por uma bota velha se o cliente não anunciar explicitamente que não quer uma bota".

António tinha-se esquecido, mais uma vez. E agora tinha apenas uma bota à sua frente.

Ponderou gravemente que as coisas tinham de mudar. Que não queria mais botas na sua vida, e que gostava que quando pedisse um hamburguer lhe trouxessem, de facto, um hamburguer.

Porque chega um momento na vida de cada um em que é altura de gritar bem alto "Eu não quero uma bota!". Chega a altura de nos levantarmos, e exigirmos o nosso direito de não ter uma bota velha quando pedimos um hamburguer!
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quarta-feira, 18 de maio de 2011

Vlad Dracula


Porque já não havia posts há muito tempo (não por falta de ideias, mas por falta de tempo) e porque nunca é demais gozar com o Twilight.
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domingo, 1 de maio de 2011

Portal



Em 2007 a Valve lançou um jogo chamado Portal. E foi a loucura.

Aquilo que era originalmente para ser um jogo extra, numa promoção que pretendia vender dois pesos pesados (Half-Life 2 e Team Fortress 2), rapidamente se tornou num dos jogos mais aclamados de sempre.

Portal tinha muitas coisas a seu favor.
Em primeiro lugar estava construído com o motor de jogo da Valve, que já tinha sido extensivamente testado e aperfeiçoado com jogos monstruosamente bons como o Half-Life 2, e que lhe permitia efeitos de luz e física fantásticos.

Depois usava como mecânica de jogo uma ideia extremanente original: a criação de portais.

Basicamente a personagem principal (Chell) tem uma Portal Gun que dispara portais para superfícies planas. Pode depois atravessar esses portais para atravessar grandes distâncias ou contornar obstáculos aparentemente inultrapassáveis. Isto é simultâneamente mais simples e complicado do que pode parecer à primeira vista.



A grande vantagem do jogo foi que não foi vendido desenvolvido como jogo de acção (contrariamente ao Prey, que apesar de também usar brincadeiras de física, era sobretudo um shooter), mas sim como um jogo de puzzles.
A personagem principal tem de ir resolvendo uma sequência de puzzles progressivamente mais complexos, sempre recorrendo à Portal Gun. Estes puzzles estão extremamente bem desenhados, sendo que não são necessariamente mais difíceis, mas cada um deles exige ao jogador que pense numa maneira diferente de usar os portais para chegar à saída, recorrendo a truques que aprendeu em puzzles anteriores. O jogo nunca se torna maçador, dificilmente se torna frustrante e é sempre desafiador.

Mas estes são os aspectos técnicos do jogo.

A Valve desde cedo que nos habituou a jogos movidos pela história. O seu primeiro jogo, Half-Life, lá longe em 1998, foi revolucionário no seu uso da narrativa dentro do jogo (sem recurso a cut-scenes) para fazer avançar o argumento sólido do jogo de uma forma fluida e credível.
Portal teve o benefício dessa experiência.

A personagem principal, Chell, acorda de uma câmara de estase dos laboratórios da Aperture Science, apenas para ser informada de que será submetida a uma sucessão de testes progressivamente mais complicados, como se se tratasse de um ratinho de laboratório. A guiá-la está GLaDOS, uma inteligência artifical que aparentemente gere todo o complexo.

Ora a GLaDOS... A GLaDOS é difícil de explicar sem estragar muita da história do jogo. E como eu já disse uma das grandes forças do jogo é a sua história.

GLaDOS aparenta ser extremamente prestável ao mesmo tempo que revela um total desinteresse pela segurança e bem-estar pela personagem principal, bem como por qualquer outro tipo de ser humano. Enquanto resolvemos puzzles a GLaDOS está sempre lá a oferecer conselhos inúteis e a sugerir que a nossa vida não tem valor absolutamente nenhum, e o que interessa é a ciência, mas sempre com promessas vagas de que no fim haverá bolo.

Os monólogos de GLaDOS estão extremamente bem escritos, com um humor negro tremendamente requintado, que são definitivamente a alma do jogo.
A maioria dos puzzles envolvem de uma maneira ou de outra a obtenção de um cubo que deve ser posto em cima de um botão para abrir uma porta (isto é uma sobre-simplificação horrenda). Mas a determinada altura no jogo um desses cubos tem um pequeno coração. É o Companion Cube, e GLaDOS avisa-nos constantemente que se trata apenas de um objecto inanimado e de que não devemos criar laços afectivos com ele. Pouco tempo depois GLaDOS informa-nos que chegou a altura de eutanaziar o Companion Cube.



O enredo propriamente dito (que eu não vou revelar aqui) é contado exclusivamente por elementos dentro do próprio jogo. Não há narração, nem texto a aparecer no ecrãn. Tudo é inferido pelas pistas vagas dadas pela GLaDOS, por notas escritas nas paredes por outros sujeitos de teste, pelo próprio ambiente pelo qual Chell navega.
Isto leva a que a história e o mundo sejam extremamente envolventes e imersivos, o que leva, naturalmente, a um investimento emocional tremendo na história.



Acabei, há umas horas, o Portal 2, e deixem-me dizer-vos que consegue ser melhor ainda que o primeiro.

A mesma excelência visual e técnica está lá, o mesmo humor está lá, os puzzles são novos e mais complexos com a adição de nova tecnologia para brincar.
Portal 2 tem a vantagem de ser uma sequela e poder partir de bases já criadas. Assim a história progride mais depressa e desta vez mostra-nos um pouco mais da história da Aperture Laboratories e introduz algumas novas personagens.

A história está pelo menos tão bem escrita como o primeiro, e houve de facto algumas situações nas quais eu dei por mim com a respiração e a frequência cardíaca acelerada de tão emocionante que a história era!!

Portal 2 é pelo menos umas 3 vezes maior que o primeiro, e tem uma componente de co-op, que eu ainda vou experimentar.

Mais do que simplesmente um jogo, Portal é toda uma experiência. Todos os elementos estão de tal maneira conjugados, o mundo está tão bem construído, tão bem integrado no universo do Half-Life, os detalhes são tão adoráveis, que é impossível uma pessoa não se enamorar pelo jogo e por todos os detalhes nele inseridos.

Portanto mesmo que geralmente não comprem jogos, se comprarem um único jogo que seja este ano, que seja o Portal 2.



E já agora deixo-vos com esta pérola de brilhantismo do primeiro jogo:

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