Pataniscas Satânicas

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domingo, 9 de agosto de 2015

Reflexões sobre o Minecraft, ou No Man's Sky - a prequela

Lembro-me da primeira vez que me apercebi do Minecraft.


Aliás, não preciso de lembrar-me porque escrevi o que é que pensei quando o experimentei pela primeira vez!

O jogo saiu em 17 de Maio de 2010, e 4 meses depois, em Setembro, eu estava a escrever isto.

Nessa altura eu era muito parvo e a melhor maneira que arranjei para explicar o que o jogo era foi esta:

Eu - É um mundo infinito gerado aleatoriamente onde podes fazer o que quiseres!
Ricardo - Fazer o quê?
Eu - Podes explorar e recolher materiais e fazer blocos e construir coisas!!!
Ricardo - E...?
Eu - ...e é isso.
Ricardo - Só isso?
Eu - Também tens zombies...
Ricardo - Ah! Tens de matar zombies!
Eu - Não tens de os matar... mas podes.. e eles só aparecem à noite..
Ricardo - Então o que é que tens de fazer?
Eu - Não tens de fazer nada! É essa a beleza do jogo podes fazer tudo o que quiseres!
Ricardo - E tu o que é que fizeste?
Eu - ...fiz uma casa.
Ricardo - Para quê?
Eu - ... para fazer uma casa.
Ricardo - Ah...
Eu - A casa é um fim em si mesmo!
Ricardo - Ah... fixe...


Hoje sou muito parvo e a melhor maneira que consigo arranjar para explicar o jogo é esta:

É um jogo no qual o mapa é infinito e sempre diferente.

Quando o Minecraft apareceu, eu estava habituado a jogos perfeitamente encapsulados no seu mapa. O Half-Life por exemplo, coloca o jogador num mapa que funciona como base de uma narrativa, portanto tem de ser completamente arquitectado como se pertencesse ao guião dessa história.
O jogador explora esse mapa, e pronto, esgotou-se o conteúdo.



Houve jogos que tentaram ser open-world, mas isso significava só que o mapa era muito grande, muito detalhado e que se podia andar por todo o lado, como o GTA ou o Red Dead Redemption.
Era imenso conteúdo para ser visto, mas quando se via todo (e houve doidos que exploraram TUDO), pronto, esgotava-se o conteúdo.



O Minecraft pretendia ser um jogo verdadeiramente open-world, fazendo com que o mapa fosse demasiado grande para ser inteiramente explorado numa vida. Naturalmente que seria impossível criar à mão cada montanha e cada rio e cada animal de um mapa quase infinito.

Em vez disso o Minecraft usava uma coisa chamada "procedurally generated content", que se traduz para português em qualquer coisa como "conteúdo gerado processualmente",  por oposição a conteúdo gerado manualmente.



Nenhuma característica desse mapa teria sido individualmente criada por ninguém. Cada acidente de terreno, cada rio, cada montanha seria gerado de forma automática, aleatória e imprevisível. O programa base de geração de mapa seguia vários processos lógicos uns atrás dos outros para gerar um mapa completamente novo todas as vezes.

Primeiro vinha uma camada do programa que montava o solo, depois outra camada esculpia as montanhas e os vales, depois outra camada decidia como é que ia ser a distribuição da água, com base no resultado anterior, depois outra camada punha a vegetação dependendo da distribuição da água, e por aí adiante.

O programa conseguia gerar um mapa com uma área igual a 8 vezes a área do planeta Terra.

Era isso o jogo.



Ou melhor, esse era o esqueleto do jogo.
Num jogo é preciso ter um objectivo, uma coisa qualquer para fazer, senão não é diferente de estar numa galeria de arte a ver os quadros. Não é que seja mau, mas não é propriamente entusiasmante.

O crafting é que era o jogo.
Recolhia-se madeira e pedra para fazer uma picareta, para escavar ferro para fazer uma espada, e por aí adiante.
Era preciso andar sempre a recolher recursos para se poder fazer mais coisas, e recursos cada vez mais raros e difíceis de obter. As ferramentas e equipamentos que se podiam fazer eram coisas que facilitavam a sobrevivência e tornavam a recolha de recursos ainda mais eficiente.

Era um ciclo vicioso auto-alimentado que era estranhamente hipnótico, e no qual eu perdi um número incontável de horas.



O jogo era a simplicidade personificada. Havia árvores genéricas, montanhas genéricas, animais genéricos. Os vilões eram um zombie, um esqueleto arqueiro, uma aranha e uma coisa verde que explodia que era um modelo de porco que saiu mal.
Não era propriamente a coisa mais criativa de sempre, mas o objectivo do jogo não era propriamente esse.



O Minecraft era sobre exploração e aventura. Não interessava que os gráficos não fossem grande coisa.

Passei semanas a construir um castelo no topo de uma montanha. Tinha muralhas, ameias, escadarias de pedra, armadilhas, salas de trono. Tinha um laboratório subterrâneo com um portal para o Submundo.
De vez em quando equipava imensa comida e tochas, várias espadas, armadura e flechas, e metia-me cavernas a dentro numa aventura. Explorava imenso, via desfiladeiros subterrâneos com lava no fundo, cavernas gigantescas. Ia recolhendo diamantes, artefactos, lutando contra monstros. O tempo que quisesse, enquanto sobrevivesse. O mapa ia sendo gerado à medida que eu avançava, portanto podia avançar tudo o que quisesse, que ia sempre ter mais desafios.

Era espectacular.


Depois fartei-me.
Um dia simplesmente deixei de achar piada às mesmas actividades e deixei de o jogar.
E saí de lá com a sensação que não tinha chegado ao "fim".

Não que houvesse um fim para ser chegado, apesar de muitas tentativas de dar alguma forma narrativa às tarefas sistematicamente mais complexas que iam aparecendo. Primeiro chegava-se ao submundo, depois para outro lugar ainda mais estranho, onde havia um dragão para matar. Fim.
Não era satisfatório.

A isto acrescia outro problema mais subtil. Como o jogo se baseava na sobrevivência e na acumulação de recursos, era uma grande vantagem ter um lugar onde guardar esses recursos, e protegermo-nos durante a noite. Isto implica que se tivesse uma base, um lugar construído.
Isto fazia com que o jogador voltasse sempre à base, evitando afastar-se muito.

Portanto a componente de exploração ficava limitada por este aspecto. Não servia de nada ter um mapa infinitamente gerável, se ninguém se queria afastar muito da sua barraca.

Agora temos o No Man's Sky.


2 comentários:

  1. Agora perspectiva-se poder ir onde se quiser, de planeta em planeta, à procura do centro disto tudo! onde está uma coisa misteriosa, que esperemos que seja espectacular.
    Continuamos a aguardar.... por uma data de lançamento!

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  2. Outro aspecto muito interessante do Minecraft, e que, curiosamente, foi o que até foi mais adoptado por uma data de outros jogos, foi o aspecto da sobrevivência. Há o Rust, o Risk of Rain, o Ark (que é o Minecraft com dinossauros) e mais umda data deles de que eu não me estou a lembrar agora.

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