Inteligências Artificiais estúpidas? Ovelhas eléctricas? Rembrandt Artificial?
Vamos falar sobre isso
No seguimento de artigos que já escrevi antes sobre Consciência Humana e Consciência Animal, vou agora tentar explorar e explicar o conceito da Consciência Artificial.
Mas antes de começarmos a falar de Consciência Artificial temos de falar de Inteligência Artificial (a partir de agora IA).
Apesar de a ideia de seres artificiais e máquinas calculadoras existir desde a antiguidade, e de George Boole ter criado a lógica algebraica que está na base da informática, é razoável dizer que toda a ideia da IA como a pensamos hoje começou com Alan Turing.
De acordo a Teoria de Computação, que Alan Turing formulou durante os anos '40, uma máquina seria capaz de simular qualquer tipo de dedução matemática usando apenas símbolos simples como 0 e 1.
Isso, associado a desenvolvimentos contemporâneos em Neurologia, Teoria de Informação e Cibernética, levou a que os investigadores pusessem pela primeira vez a hipótese de construir um cérebro electrónico.
Ou seja, pôr máquinas a imitarem processos cognitivos humanos como a resolução de problemas ou a aprendizagem.
Não vos vou maçar com a história da evolução das IAs, sobretudo porque já estão por todo o lado à nossa volta.
Seja nos assistentes pessoais que estão nos smartphones e computadores, como a Siri, o Google Now ou a Cortana, os inimigos virtuais que nos matam nos jogos de computador, ou quando a Amazon nos tenta sugerir coisas para comprar com base nas nossas compras anteriores, as Inteligências Artificiais já fazem parte do nosso dia-a-dia.
Então porque é que ainda não tentaram dominar o mundo!?
Basicamente porque para Inteligências Artificiais, não é difícil expôr o quão estúpidas ainda são.
(a resposta aborrecida é porque não estão programadas para isso - não se preocupem, prometo que vamos falar de robots que dominam o mundo)
Por engraçado que seja conversar com o Cleverbot, qualquer conversa com mais do que 5-10 minutos começa a expôr as limitações do programa.
Apesar de lidarem muito bem com lógica rígida, estas Inteligências Artificiais têm imensa dificuldade em decifrar frases ambíguas ou que necessitam de contexto para serem interpretadas.
Por exemplo, na frase "O Troféu não cabia dentro da Mala porque era demasiado grande", uma Inteligência Artificial tem dificuldade em perceber se é o Troféu ou a Mala que é demasiado grande.
Neste tipo de situações as IAs acertam pouco mais do que se estivessem a responder aleatoriamente.
Mas pronto, em vez de estarmos a gozar com estas pobres IAs e as suas limitações (que é relativamente semelhante a gozarmos com pessoas deficientes - também mais sobre isto mais tarde) vamos em vez disso falar dos limites que estão lentamente a ser ultrapassados.
Disse antes que a IA pretende simular processos cognitivos humanos, portanto que processos cognitivos são esses?
Resolução de Problemas
À medida que um problema se torna mais complexo, o número de variações que têm de ser avaliadas cresce exponencialmente de maneira tão rápida que se torna impossível de calcular em tempo útil. Infelizmente a maior parte dos problemas que nos interessam são mesmo muito complexos.
Num jogo de Xadrez há 20 jogadas iniciais possíveis, e se quiserem antecipar as primeiras 15 jogadas possíveis (algo que jogadores de Xadrez experientes são capazes de fazer), têm de calcular 20^15 jogadas, ou seja 3.3x10^19 sequências. Mesmo que o vosso computador conseguisse calcular 1000 000 000 jogadas por segundo, demoraria 10 mil anos a resolver o problema.
Os jogadores de xadrez obviamente não estão a deduzir essas jogadas passo a passo, num raciocínio dedutivo. Em vez disso usam julgamentos rápidos e intuitivos.
À semelhança disso desenvolveram-se Redes Neurais Artificiais, directamente inspiradas no nosso Sistema Nervoso Central, nas quais um problema é desmontado nas suas várias componentes, cada uma das quais é trabalhada por uma camada de programas que produzem um resultado parcial que é fornecido a outra camada de programas que fornecem outro resultado parcial, e por aí fora, até atingir um resultado razoável.
(não se preocupem, vamos ver mais exemplos disto mais abaixo)
Adicionalmente, para problemas em que há informação ambígua, incerta ou incompleta, usam-se conceitos de probabilidade e economia para simular a capacidade humana de adivinhar.
Representação de Conhecimento
Se vamos resolver problemas, isso significa que temos de ter perguntas e respostas, e isso significa representar sob a forma de dados computáveis a informação e conhecimento que compõe essas perguntas e respostas.
Uma IA necessita de ser capaz de representar coisas como objectos, propriedades, categoras e relações entre objectos, situações, eventos, estados e tempo, causas e efeitos, e conhecimento sobre conhecimento, e outras coisas ainda mais abstractas que não foram adequadamente investigadas ou definidas.
Isto é complicado por problemas como o Problema da Qualificação (um pássaro é uma coisa pequena, que canta e voa, e nenhum destes dados é verdade para todos os pássaros), a vastidão de factos individuais que é possível saber (propõe-se pôr IAs a ler a internet) e o Conhecimento Sub-Simbólico (a maior parte do que sabemos não é facilmente representável por símbolos únicos e não-ambíguos - sabemos dizer facilmente se gostamos de uma pintura ou não, mas essa afirmação é composta por uma quantidade difícil de definir de elementos ditos sub-simbólicos).
Percepção
A junção destas duas coisas (a Resolução de Problemas e a Representação de Conhecimento) permite às IAs "verem" no verdadeiro sentido da palavra.
Para ensinarmos uma IA a a "ver" temos de lhe mostrar milhares de imagens do que quisermos que ela veja, e dizer-lhe para procurar padrões nessas imagens. Para procurar as linhas, e como as linhas se relacionam, para procurar os ângulos, para procurar os cantos, para procurar os lugares onde há contrastes.
A IA faz isto recorrendo a uma daquelas Redes Neurais Artificiais de que falei em cima.
Depois de a IA ter visto milhares de imagens, e de ter determinado quais são os padrões de formas comuns a todas essas imagens, dizemos à IA "isso que tu viste é esta coisa específica"
Depois, quando lhe mostrarmos uma imagem e lhe perguntarmos se há lá essa coisa a IA vai procurar esse padrão, e se for semelhante o suficiente vai dizer-nos que sim, há lá um resultado positivo.
Por exemplo, quando se tentou ensinar o Programa de Reconhecimento de Conteúdo da Google a reconhecer halteres, foram-lhe mostradas milhares de imagens de halteres para ela aprender a reconhecer o padrão dos halteres.
Acidentalmente, como muitas dessas imagens incluíam pessoas a levantarem o halter, a IA aprendeu que dentro do conceito de "halter" incluía-se também o braço que o levantava.
Isto é muito semelhante à forma como o nosso próprio cérebro está programado para ver reconhecer padrões, e especificamente caras.
Lembram-se de quando falámos de Pareidolia, logo no primeiro artigo sobre Consciência Humana?
Imaginem que ensinamos uma IA a reconhecer padrões de animais, e depois damos-lhe uma imagem onde não existem animais, mas obrigamo-lo a mesmo assim procurar por animais.
Há qualquer coisa de fascinante em perceber que esta imagem representa, muito literalmente, uma máquina a halucinar, a "ver" coisas que não estão lá.
Máquinas a sonharem - será que sonham com ovelhas eléctricas?
A geração de imagens oníricas e psicadélicas por este processo, usando o Google Deep Dream, é um excelente exemplo de como funciona um programa de Reconhecimento Visual que imita o processo cognitivo humano.
Há imensa investigação e inovação na área da Percepção, e naturalmente existem outras formas de processar informação visual. Outras áreas a serem desenvolvidas são a percepção táctil e auditiva, nomeadamente o reconhecimento de discurso
Planeamento
Uma IA tem de ser capaz de estabelecer objectivos e depois atingi-los. Isto significa que tem de ter uma representação do mundo actual, do mundo futuro, fazer previsões sobre como as suas decisões alteram o mundo, e escolher quais dessas decisões a aproximam desse mundo futuro que quer atingir.
Se começarmos a tornar o problema mais complicado, assumindo a existência de vários agentes de acção no mundo, a IA tem de começar a reavaliar o seu mundo e a reajustar as suas decisões, o que implica também que tem de lidar com a incerteza. É isto que também explica os fenómenos de comportamentos complexos emergentes em inteligência colonial, como nas formigas e abelhas.
IAs que que têm de se desenvencilhar sozinhas durante muito tempo são as que usam este tipo de programas, e estão presentes no Telescópio Hubble e no Mars Curiosity Rover.
Aprendizagem
Lembram-se quando eu há pouco disse que era complicado prever e planear as jogadas num jogo de Xadrez?
O jogo chinês tradicional Go é ainda mais complicado.
Num jogo de Go profissional o tabuleiro tem 361 posições (por oposição às 64 do Xadrez), há uma média de 150-250 jogadas legais por turno (por oposição às 37 do Xadrez), e contrariamente ao Xadrez, no Go uma jogada inicial pode ter influência centenas de jogadas no futuro, e é muito mais difícil avaliar quem é que tem a vantagem relativa.
Existem mais variações possíveis de um jogo de Go do que átomos no universo.
Recorrendo às Redes Neurais Artificiais de que já falámos, o projecto Google DeepMind criou um conjunto de algoritmos que pretendem simular modelos abstractos de alto-nível, o programa AlphaGo.
Depois, basicamente, em vez de porem o AlphaGo a memorizar todas as jogadas possíveis de Go, ensinaram-lhe a estratégia do jogo. Mostraram-lhe cerca de 30 milhões de jogadas de jogadores humanos, e depois puseram-no a jogar consigo mesmo, usando aprendizagem reforçada.
Em Março de 2016, o AlphaGo obteve uma vitória de 4-1 contra Lee Sedol, 18 vezes campeão mundial de Go.
Linguagem
A língua portuguesa é muito traiçoeira, e isso tem sobretudo a ver com o contexto e a semântica, e expressões como "à grande e à francesa" ou "coisas do arco da velha" são notoriamente difíceis de traduzir.
Google Translate - Português para Inglês:
"Portuguese is very tricky , and it has mostly to do with the context and semantics , and expressions such as " the great and the French " or " bow things the old " are notoriously difficult to translate."
Vamos falar sobre isso
No seguimento de artigos que já escrevi antes sobre Consciência Humana e Consciência Animal, vou agora tentar explorar e explicar o conceito da Consciência Artificial.
Mas antes de começarmos a falar de Consciência Artificial temos de falar de Inteligência Artificial (a partir de agora IA).
Alan Turing - 1912-1954 |
De acordo a Teoria de Computação, que Alan Turing formulou durante os anos '40, uma máquina seria capaz de simular qualquer tipo de dedução matemática usando apenas símbolos simples como 0 e 1.
Isso, associado a desenvolvimentos contemporâneos em Neurologia, Teoria de Informação e Cibernética, levou a que os investigadores pusessem pela primeira vez a hipótese de construir um cérebro electrónico.
Ou seja, pôr máquinas a imitarem processos cognitivos humanos como a resolução de problemas ou a aprendizagem.
Não vos vou maçar com a história da evolução das IAs, sobretudo porque já estão por todo o lado à nossa volta.
Seja nos assistentes pessoais que estão nos smartphones e computadores, como a Siri, o Google Now ou a Cortana, os inimigos virtuais que nos matam nos jogos de computador, ou quando a Amazon nos tenta sugerir coisas para comprar com base nas nossas compras anteriores, as Inteligências Artificiais já fazem parte do nosso dia-a-dia.
Então porque é que ainda não tentaram dominar o mundo!?
Basicamente porque para Inteligências Artificiais, não é difícil expôr o quão estúpidas ainda são.
(a resposta aborrecida é porque não estão programadas para isso - não se preocupem, prometo que vamos falar de robots que dominam o mundo)
Por engraçado que seja conversar com o Cleverbot, qualquer conversa com mais do que 5-10 minutos começa a expôr as limitações do programa.
Apesar de lidarem muito bem com lógica rígida, estas Inteligências Artificiais têm imensa dificuldade em decifrar frases ambíguas ou que necessitam de contexto para serem interpretadas.
Por exemplo, na frase "O Troféu não cabia dentro da Mala porque era demasiado grande", uma Inteligência Artificial tem dificuldade em perceber se é o Troféu ou a Mala que é demasiado grande.
Neste tipo de situações as IAs acertam pouco mais do que se estivessem a responder aleatoriamente.
Mas pronto, em vez de estarmos a gozar com estas pobres IAs e as suas limitações (que é relativamente semelhante a gozarmos com pessoas deficientes - também mais sobre isto mais tarde) vamos em vez disso falar dos limites que estão lentamente a ser ultrapassados.
Disse antes que a IA pretende simular processos cognitivos humanos, portanto que processos cognitivos são esses?
Resolução de Problemas
À medida que um problema se torna mais complexo, o número de variações que têm de ser avaliadas cresce exponencialmente de maneira tão rápida que se torna impossível de calcular em tempo útil. Infelizmente a maior parte dos problemas que nos interessam são mesmo muito complexos.
Num jogo de Xadrez há 20 jogadas iniciais possíveis, e se quiserem antecipar as primeiras 15 jogadas possíveis (algo que jogadores de Xadrez experientes são capazes de fazer), têm de calcular 20^15 jogadas, ou seja 3.3x10^19 sequências. Mesmo que o vosso computador conseguisse calcular 1000 000 000 jogadas por segundo, demoraria 10 mil anos a resolver o problema.
Os jogadores de xadrez obviamente não estão a deduzir essas jogadas passo a passo, num raciocínio dedutivo. Em vez disso usam julgamentos rápidos e intuitivos.
Modelo de uma Rede Neural Artificial |
À semelhança disso desenvolveram-se Redes Neurais Artificiais, directamente inspiradas no nosso Sistema Nervoso Central, nas quais um problema é desmontado nas suas várias componentes, cada uma das quais é trabalhada por uma camada de programas que produzem um resultado parcial que é fornecido a outra camada de programas que fornecem outro resultado parcial, e por aí fora, até atingir um resultado razoável.
(não se preocupem, vamos ver mais exemplos disto mais abaixo)
Adicionalmente, para problemas em que há informação ambígua, incerta ou incompleta, usam-se conceitos de probabilidade e economia para simular a capacidade humana de adivinhar.
Representação de Conhecimento
Se vamos resolver problemas, isso significa que temos de ter perguntas e respostas, e isso significa representar sob a forma de dados computáveis a informação e conhecimento que compõe essas perguntas e respostas.
Uma IA necessita de ser capaz de representar coisas como objectos, propriedades, categoras e relações entre objectos, situações, eventos, estados e tempo, causas e efeitos, e conhecimento sobre conhecimento, e outras coisas ainda mais abstractas que não foram adequadamente investigadas ou definidas.
Isto é complicado por problemas como o Problema da Qualificação (um pássaro é uma coisa pequena, que canta e voa, e nenhum destes dados é verdade para todos os pássaros), a vastidão de factos individuais que é possível saber (propõe-se pôr IAs a ler a internet) e o Conhecimento Sub-Simbólico (a maior parte do que sabemos não é facilmente representável por símbolos únicos e não-ambíguos - sabemos dizer facilmente se gostamos de uma pintura ou não, mas essa afirmação é composta por uma quantidade difícil de definir de elementos ditos sub-simbólicos).
Ontologia é a uma representação do que existe |
A junção destas duas coisas (a Resolução de Problemas e a Representação de Conhecimento) permite às IAs "verem" no verdadeiro sentido da palavra.
Para ensinarmos uma IA a a "ver" temos de lhe mostrar milhares de imagens do que quisermos que ela veja, e dizer-lhe para procurar padrões nessas imagens. Para procurar as linhas, e como as linhas se relacionam, para procurar os ângulos, para procurar os cantos, para procurar os lugares onde há contrastes.
A IA faz isto recorrendo a uma daquelas Redes Neurais Artificiais de que falei em cima.
Rede Neural Artificial que analisa imagens |
Como uma máquina procura padrões de linhas e curvas numa imagem |
Depois, quando lhe mostrarmos uma imagem e lhe perguntarmos se há lá essa coisa a IA vai procurar esse padrão, e se for semelhante o suficiente vai dizer-nos que sim, há lá um resultado positivo.
Por exemplo, quando se tentou ensinar o Programa de Reconhecimento de Conteúdo da Google a reconhecer halteres, foram-lhe mostradas milhares de imagens de halteres para ela aprender a reconhecer o padrão dos halteres.
Acidentalmente, como muitas dessas imagens incluíam pessoas a levantarem o halter, a IA aprendeu que dentro do conceito de "halter" incluía-se também o braço que o levantava.
Isto é muito semelhante à forma como o nosso próprio cérebro está programado para ver reconhecer padrões, e especificamente caras.
Lembram-se de quando falámos de Pareidolia, logo no primeiro artigo sobre Consciência Humana?
Imaginem que ensinamos uma IA a reconhecer padrões de animais, e depois damos-lhe uma imagem onde não existem animais, mas obrigamo-lo a mesmo assim procurar por animais.
Há qualquer coisa de fascinante em perceber que esta imagem representa, muito literalmente, uma máquina a halucinar, a "ver" coisas que não estão lá.
Máquinas a sonharem - será que sonham com ovelhas eléctricas?
A geração de imagens oníricas e psicadélicas por este processo, usando o Google Deep Dream, é um excelente exemplo de como funciona um programa de Reconhecimento Visual que imita o processo cognitivo humano.
Há imensa investigação e inovação na área da Percepção, e naturalmente existem outras formas de processar informação visual. Outras áreas a serem desenvolvidas são a percepção táctil e auditiva, nomeadamente o reconhecimento de discurso
Planeamento
Uma IA tem de ser capaz de estabelecer objectivos e depois atingi-los. Isto significa que tem de ter uma representação do mundo actual, do mundo futuro, fazer previsões sobre como as suas decisões alteram o mundo, e escolher quais dessas decisões a aproximam desse mundo futuro que quer atingir.
Se começarmos a tornar o problema mais complicado, assumindo a existência de vários agentes de acção no mundo, a IA tem de começar a reavaliar o seu mundo e a reajustar as suas decisões, o que implica também que tem de lidar com a incerteza. É isto que também explica os fenómenos de comportamentos complexos emergentes em inteligência colonial, como nas formigas e abelhas.
IAs que que têm de se desenvencilhar sozinhas durante muito tempo são as que usam este tipo de programas, e estão presentes no Telescópio Hubble e no Mars Curiosity Rover.
O Mars Curiosity Rover tira uma selfie (!!!) |
Lembram-se quando eu há pouco disse que era complicado prever e planear as jogadas num jogo de Xadrez?
O jogo chinês tradicional Go é ainda mais complicado.
Num jogo de Go profissional o tabuleiro tem 361 posições (por oposição às 64 do Xadrez), há uma média de 150-250 jogadas legais por turno (por oposição às 37 do Xadrez), e contrariamente ao Xadrez, no Go uma jogada inicial pode ter influência centenas de jogadas no futuro, e é muito mais difícil avaliar quem é que tem a vantagem relativa.
Existem mais variações possíveis de um jogo de Go do que átomos no universo.
Recorrendo às Redes Neurais Artificiais de que já falámos, o projecto Google DeepMind criou um conjunto de algoritmos que pretendem simular modelos abstractos de alto-nível, o programa AlphaGo.
Depois, basicamente, em vez de porem o AlphaGo a memorizar todas as jogadas possíveis de Go, ensinaram-lhe a estratégia do jogo. Mostraram-lhe cerca de 30 milhões de jogadas de jogadores humanos, e depois puseram-no a jogar consigo mesmo, usando aprendizagem reforçada.
Em Março de 2016, o AlphaGo obteve uma vitória de 4-1 contra Lee Sedol, 18 vezes campeão mundial de Go.
Linguagem
A língua portuguesa é muito traiçoeira, e isso tem sobretudo a ver com o contexto e a semântica, e expressões como "à grande e à francesa" ou "coisas do arco da velha" são notoriamente difíceis de traduzir.
Google Translate - Português para Inglês:
"Portuguese is very tricky , and it has mostly to do with the context and semantics , and expressions such as " the great and the French " or " bow things the old " are notoriously difficult to translate."
Google Translate - Inglês para Português:
"O português é muito complicado, e tem sobretudo a ver com o contexto e na semântica, e expressões como "o grande e os franceses" ou "arco coisas o velho" são notoriamente difíceis de traduzir."
Isso significa que actualmente os sistemas de Processamento de Linguagem Natural recorrem mais uma vez a algoritmos de aprendizagem, modelos estatísticos e decisões probabilísticas para conseguirem extrair os significados do contexto e comunicarem efectivamente.
Movimento e Manipulação
Robots dotados de AI são capazes de interagir com o seu ambiente autonomamente, sem uma fonte de controlo externa, e são capazes de determinar reacções a objectos e problemas que encontrem, resolvendo problemas de manipulação de objectos e navegação.
Isto implica resolver problemas de localização (saber onde está e onde as coisas estão), mapeamento (construir uma representação do ambiente), planeamento de trajecto (decidir qual a melhor maneira de ir do ponto A ao ponto B) e planeamento de movimento (como não cair pelo caminho).
Emoções e Criatividade
Na vanguarda da investigação de IA estão coisas como a Computação Afectiva, que é o estudo e desenvolvimento de máquinas capazes de reconhecer, interpretar, processar e simular emoções humanas ou até mesmo simular empatia.
Isto permitiria às IAs prever as acções de outros, por compreenderem as suas motivações e os seus estados emocionais, e adaptar o seu comportamento.
Simular a criatividade humana é particularmente complicado, porque nem nós sabemos definir bem o que é a criatividade ou a originalidade.
No entanto, e mais uma vez recorrendo a Redes Neurais Artificiais, é possível codificar o que são essencialmente Tropes e através de Criatividade Combinatorial e Mistura Conceitual, chegar a obras de arte que podem ser consideradas originais.
Nesse sentido já existem filmes escritos por IAs, IAs que estudaram Rembrandt e recriaram quadros no seu estilo, e IAs que escrevem artigos noticiosos.
Quadro original no estilo de Rembrandt pintado por uma IA |
Poderão ter reparado numa coisa interessante, nem que não seja porque eu estive sempre a repeti-la.
Todas estas áreas que representam os principais desafios ao desenvolvimento de IAs, e as soluções encontradas para as resolver simulam processos cognitivos humanos.
Mas de que maneira devem simular esses processos cognitivos? Será que devem basear-se mais na Neurologia (como nas Redes Neurais Artificiais)? Ou será que devem basear-se na Psicologia (como na Ontologia de Conceitos de Representação de Conhecimento)?
E quem é que diz que as IAs têm sequer de simular processos cognitivos humanos? Será que a biologia humana é tão irrelevante para a IA como a biologia dos pássaros é irrelevante para a aeronáutica?
Será que existem maneiras de executar estas mesmas tarefas que não têm nada a ver com a maneira como acontecem dentro do nosso cérebro? A evolução e a biologia são capazes de soluções espantosas, mas isso não quer dizer que sejam as mais eficientes.
Adicionalmente, por muito impressionantes que sejam (e são) as IAs de que eu estive a falar, não são mais conscientes do que a sua calculadora.
Porque, não nos esqueçamos, o título deste artigo é "O que é a Consciência Artificial" e não "O que é a Inteligência Artificial". O que nos interessa é a Consciência.
"Inteligência" tem a tendência para se confundir com "Consciência" no nosso vocabulário normal, mas a verdade é que a Inteligência é só uma das muitas ferramentas que constroem uma Consciência.
E estas IAs de que aqui estivemos a falar não são mais do que isso. Ferramentas.
Não nos interessa o martelo, ou o mecanismo que produz a Pareidolia, interessa-nos a entidade introspectiva, senciente, com sentido de EU, que os usa.
Para perceber se essa Consciência pode de facto existir não percam a Parte II - Fantasma dentro da Máquina.
Ps: eu sei que estou a fazer uma sobre-simplificação gigantesca de um tema incrivelmente profundo e complexo, que mal estou a arranhar a superfície. Mas senti que preferia dar-vos uma versão compreensível e muito geral do tema, e não perder-me em detalhes de informática e programação que seriam densos e nos quais eu faria (ainda) mais incorrecções.
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