37 tiros e uma explosão depois, ele estava a correr, sem se
lembrar de ter dado ordem às pernas para se mexerem.
Engolia o ar frio às golfadas enquanto saltava por cima das
ruínas metálicas da fábrica velha, ainda sem consciência que a explosão lhe tinha
substituído os tímpanos por campainhas. Entrou num corredor escuro e continuou até
uma pancada incrível na cabeça o deixar deitado de costas, a contorcer-se em
pânico, agarrado à cabeça com as mãos ensopadas em sangue.
O pânico transformou-se em confusão, porque um tiro na
cabeça não leva a muito pânico, ou sequer confusão. Quando conseguiu, olhou em
todas as direções por entre os dedos.
A dor excruciante na têmpora direita só apareceu quando viu
a conduta de ar pendente, suja de sangue. Depois de se levantar, entrou na
primeira sala que que se ofereceu. Tinha corrido sem olhar para trás, e
escondeu-se ofegante, sem saber onde.
Quanto tempo tinha passado? 2 minutos? Meia
hora? Teria sido suficiente?
Claro que não. Ele próprio já tinha perseguido e morto
vários desgraçados que tinham tentado fugir. Não se lembrava de algum ter
escapado. ‘’Eles vêm aí…’’
Tinha imaginado o que sentiria se isto acontecesse, em
fantasias tiradas de filmes de samurais. Gritos de guerra e cargas cegas,
desesperadas, com o fogo na barriga da cavalaria britânica na batalha da
balaclava.
‘’Half a
league, half a league,
Half a league onward…’’
Estranho não sentir a raiva gloriosa dos últimos minutos de
quem viveu com a honra ou a morte como únicas certezas. O fogo na barriga que
sentia era a azia de quem não tinha comido hoje, que o fazia arrotar ácido de
maneira não muito gloriosa. Vomitou o mais silenciosamente que conseguiu, até
que uma irregularidade no silvo contínuo que tinha nos ouvidos desde a explosão
que muito provavelmente tinha morto o irmão dele, retesou-lhe os músculos. Qualquer
coisa a sussurrar nas sombras… O vento?
Estava frio. Outra vez. As memórias que ele tinha de estar
quente e confortável estavam esbatidas. Mantinha a vaga ideia que algures, um
dia, o mundo tinha sido um lugar seguro. Agora, sozinho no escuro, alerta, abraçado
às pernas dormentes, encostado a uma viga gelada de aço cinzento, escutava.
Apesar das náuseas e suores frios, a opressão do silêncio na sala ajudava um
pouco a estancar o pânico.
‘’Eles vêm aí…. ‘’
O bater do coração precipitado, fez com que começasse a
beber o ar em golos pequenos e irregulares.
‘’Calma… calma, calma….’’ Murmurou para si próprio, numa voz
rouca pela garganta arranhada pelos vómitos. Não podia deixar o medo afogá-lo.
Não agora.
Tinha treinado durante anos. Tinha morto pelo menos 3 deles no
último quarto de hora…. Porque é que as mãos dele insistiam em tremer? Porque é
que tinha aço nas mandíbulas?
Havia calor a espalhar-se pelo colo dele, que pingou numa
poça pequena.
O desfecho provável dos próximos minutos deixavam-no
aterrado, ao mesmo tempo que o último cartucho de munições na semiautomática
tornava-o consciente da faca de mato no tornozelo.
’’Porque é que estão a demorar tanto tempo?’’… ‘’Será que
passou assim tanto tempo?’’
Tornou a mostrar um olho cauteloso à paisagem. As sombras
ondulavam por cima de um cadáver encostado à ombreira de outra porta que dava
acesso aos fornos da fábrica. O sangue que lhe tinha brotado abundante do
orifício supraciliar, estava agora reduzido a um fio rosado que nascia de um
coágulo preto. ‘’Que sítio estúpido para morrer…’’
Finalmente ouviu qualquer coisa. Nada de especial, mas o
suficiente. Eles estavam na sala, provavelmente atrás da primeira fornalha.
2…
não 3, pelos passos. Ouviu uma troca de palavras sussurradas.
Pareciam assustados... Um deles recomendava extremo cuidado
ao outro.
Será que tinham ouvido falar da reputação dele?
Talvez o desespero dele tenha sido prematuro. Um princípio de
coragem parecia querer levantá-lo, disparam, matá-los, fugir para casa. Um
cartucho era mais que suficiente, porra.
Para casa....
O efeito surpresa estava do seu lado. ‘’Os filhos da puta
nem vão perceber…’’
‘’Forward,
the light brigade!
Was there a
man dismay’d?
Theirs not
to make reply,
Their’s not
to reason why,
Their’s but
to do and die…’’
‘’FIlhos da putaaa….’’ Quando se levantou, o sangue ainda
lhe pingava da testa, cheirava a vómito, tinha as pernas dormentes e a começar
a ficar geladas do mijo… mas a mão…. A mão dele sempre foi rápida como um relâmpago.
Alguma coisa arrancou-lhe o ar dos pulmões, antes de ouvir a
Mark 2 Lancer Assault Rifle trovejar
em todo o esplendor do seu calibre 0.5. Pelo que sentiu, podia ter sido uma
locomotiva.
‘’Into the valley of death,
Rode the sixhundred…’’
Deitado de costas viu que no tecto estava a moldura de uma
conduta de ar, com uma escada que levava à superfície, ao alcance de um pequeno
salto. Duas estrelas mortiças cintilavam lá em cima, cada vez mais desfocadas…
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As estrelas desfocadas foram obliteradas pela zona pélvica
do primeiro locust que mal se aproximou começou imediatamente a baixar-se e a
levantar-se por cima da cabeça dele, a despropósito e várias vezes, antes de se
ler no ecrã: ‘’N00b!!! N00balhão!’’
‘’Carlos, a comida está na mesa! Vai ficar fria!’’
‘’Cala-te, já vou! Fizeste-me perder, mãe! Já disse que já
vou!’’
‘’Deixa-te de parvoíces e despacha-te.’’
Espectacular!
ResponderEliminarExijo, o mais veementemente possível, uma versão Skyrim disto!
Vamos pensar nisso! Ao Carlos!
EliminarAh... O Carlos... Nunca gostou de perder...
EliminarLembro-me bem que até no último suspiro se esforçou com tamanha bravura... http://youtu.be/7hE5Pk8F4Uo
A toast to his memory
Ao carlos!
Eliminarhttp://youtu.be/7hE5Pk8F4Uo - ''aí vai uma dica, se tu desenhar um caralho na parede, o tempo vai passar mais rápido... ''
Eliminarmuito bom!