Pataniscas Satânicas

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quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Estigmas Mentais

Sabiam que Portugal têm uma taxa de doença mental das mais elevadas da Europa?

Já que abordamos recentemente a psicologia positiva, hoje vou escrever sobre explicações simplistas para assuntos complexos. Um dos motivos pelos quais a psicologia positiva me irrita tanto, é que é interpretada como solução para a depressão.  Isto manifesta-se através de uma confusão acidental entre tristeza e depressão. Não é a única confusão...

Enquanto população, sabemos pouco sobre doença mental. Não entendemos a depressão como uma doença a sério, da mesma maneira que entendemos uma perna partida, por exemplo. Muitos de nós acham que a esquizofrenia é ter dupla personalidade.


Quantas vezes já ouvi: ''tinha umas dores no peito há um mês, fui ao médico e afinal não tinha nada, era tudo só ansiedade.'' Ainda bem! Quem é que quer ter uma cartilagem inflamada na caixa torácica, quando pode potencialmente ter uma perturbação de ansiedade grave o suficiente para dar dores no peito?


Pareceu-me importante, verificar que em Portugal há mesmo muita gente assim meio lelé da cuca. Pessoal avariado da caixa dos pirulitos, e que não bate bem da bola.

Porque é que temos tantas maneiras de dizer a coisa? O que é que alguém com esquizofrenia pensa, quando ouve dizer que não joga com o baralho todo? Que é chanfrado dos cornos? Que tem um parafuso a menos?

Como é que a população geral pensa quando lê notícias como esta? E como esta?

Ah, e sabiam que os gatos podem causar esquizofrenia? Ah pois! Cuidado quando saírem de casa, porque a vizinha de 80 anos no 3º esquerdo, pode começar a atirar gatos da janela, por medo de ficar chalupa.


E quando há um deprimida que mete baixa? Aí é que a porca torce o rabo! Ainda pior quando é um homem! Toda a gente sabe que os homens não ficam deprimidos. E que o estigma não existe...

''Está deprimida, sim, deve estar mesmo. Também eu! Estou muito deprimida, e também quero ficar em casa a dormir até ao meio dia!''

Há muita depressão em Portugal. É o segundo país do mundo nas taxas da doença. O que é interessante, é que toda a gente fica muito surpreendida quando as baixas disparam, sempre que as condições de trabalho se degradam. Começam logo a gritar fraude, e publicam notícias como esta:

''As medidas de austeridade anunciadas pelo Governo, combinadas com a ameaça de perder o posto de trabalho, numa altura em que a taxa de desemprego bate recordes e vai subir, pelo menos, até 2013, tem provocado um pico no número de trabalhadores que metem baixa por depressão.... A Segurança Social tem-se empenhado em detectar falsas baixas. Em 2010, foram detectados mais de 70 mil casos irregulares que, se não tivessem sido corrigidos, teriam custado 4,3 milhões aos cofres do Estado.''

Em 2010, 70.000 aldrabões, a quem o Médico de Família que as conhece há anos, passou baixa, foram postos a trabalhar pelas juntas médicas que os entrevistaram durante 15-20 minutos. Fez-se justiça! Os deprimidos são é preguiçosos que, à mínima contrariedade laboral querem ficar em casa no laréu! 
As pessoas que comem gelados com a testa são uns chupistas que faz impressão. Andam a fingir que têm a tampa mal fechada, para não trabalhar.

Não deixa de ser verdade que há países que tratam a doença mental pior do que nós... Como arma para retirar direitos à população.

Outra verdade, é que este estigma cria medo e desconfiança nas pessoas que sofrem de depressão. Se a depressão é vista como uma indulgência, um sinal de fraqueza de carácter, a resposta adaptativa de quem tem a doença, vai ser tentar manter a situação em segredo. E todos sabemos como isso ajuda imenso... 


Pior do que isso, as pessoas com depressão começam a sentir-se culpadas (o que é típico) de terem a doença! Acreditam com muita facilidade que é mesmo uma falha de carácter, e que não conseguirem sair da cama de manhã é sinal de preguiça.


As pessoas com depressão são vistas como manipuladoras do sistema, desconfiam que elas estão a fingir, são alvo de pena e coscuvilhice. São vistas como frágeis e dissimuladas. Afinal, hoje em dia toda a gente tem a mania que tem uma doença qualquer, certo?


Realmente, fingir uma depressão e ficar sujeito aos estereótipos, parece ser muito agradável.

O Last Week Tonight teve um segmento há uns meses sobre a situação nos EUA.


E quem podia esquecer, êxitos como:

- Tu comes merda às colheres;
- Uns morrem, outros ficam assim...;  :D

2 comentários:

  1. Ainda ontem fiz uma consulta a uma miúda de 23 anos com uma Depressão Major (com os critérios quase todos) que me disse que tinha de tomar os comprimidos às escondidas porque toda a gente lhe dizia que ela era demasiado nova para estar a tomar comprimidos e para estar deprimida.

    Tive de passar quase uma hora a convencê-la que a depressão não era culpa dela, que não era por ser fraca.

    Eu dizia que era o mesmo que acusar um diabético de ser fraco por não conseguir obrigar o seu pâncreas a produzir mais insulina.

    Ela respondia que não era a mesma coisa, que era da cabeça.

    E sim, é verdade, é da cabeça, realmente.

    É muito difícil convencer as pessoas que as suas ideias abstractas e pensamentos conscientes podem estar absolutamente dependentes de coisas tão mundanas e pouco etéreas como neurotransmissores.

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    1. Podes sempre dizer que a diabetes também é da cabeça..... do pâncreas!

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