Vamos falar sobre isso.
Passamos a maior parte da nossa vida a controlar o nosso corpo voluntariamente, portanto é perdoável esquecermo-nos quantas estão realmente fora do nosso controlo.
O Sistema Nervoso Autónomo é uma divisão do Sistema Nervoso Periférico que controla a maior parte dos orgãos de forma insconsciente. Regula coisas como a digestão, dilatação pupilar, urinação e a excitação sexual.
Dentro do cérebro temos o Hipotálamo que controla a respiração, o ritmo cardíaco, actividade vasomotora e várias acções reflexas como o tossir, espirrar, engolir e vomitar.
Mas isso são tudo coisas com as quais não temos habitualmente de nos preocupar, que vão acontecendo sozinhas sem lhes prestarmos atenção.
Imaginem se o vosso coração dependesse de controlo voluntário para bater, e quando se distraíssem com outra coisa o coração parasse. Era chato.
De igual forma, apesar de conseguirem controlar a respiração voluntariamente, durante a maior parte do dia não estão conscientemente a gerir a respiração.
Excepto agora que vos fiz pensar no assunto.
Agora estão a respirar em manual, em vez de automático.
É chato, eu sei, mas já passa quando se distraírem disso.
Mas e coisas voluntárias como os movimentos? Quando mexemos os braços e as pernas?
Essas, certamente, estão inteiramente sob o nosso controlo voluntário!
Ou estão?
Faça uma experiência.
Procure um objecto à sua volta. Pegue nele.
Fácil, certo?
Só teve de identificar o objecto, esticar o braço, e pegar nele com a mão. Simples.
Repare que durante esse processo, não teve de estar preocupado em levantar o ombro de maneira a elevar o braço, ou estender o cotovelo de forma coordenada de maneira a esticar o antebraço, nem sequer teve de estar preocupado em abrir cada um dos dedos individualmente, e muito menos teve de se preocupar com a possibilidade de a mão ir numa direcção diferente do objecto.
Todos esses micro-cálculos e pequenos ajustes de postura, distância, velocidade, vector de movimento, relação espacial de objectos são calculados automaticamente pelo seu Cerebelo, uma estrutura no cérebro dedicada sobretudo ao movimento voluntário.
Cerebelo a vermelho |
Ou seja, uma grande parte dos nossos movimentos voluntários não é de facto consciente, estando relegada para mecanismos inconscientes e automáticos que tratam dos detalhes chatos do movimento, para que possamos perder tempo a pensar noutras coisas.
Ou seja, à semelhança da respiração e do batimento cardíaco, os nossos movimentos acontecem em modo automático
É uma chatice muito grande quando o Cerebelo começa a não funcionar bem, porque o Córtex Préfrontal é péssimo a conduzir em modo manual.
Quando há lesões no cerebelo é normal surgirem problemas no controlo motor do corpo.
Pode haver diminuição do tónus muscular (hipotonia), alteração da articulação das palavras (disartria), dificuldade a determinar distâncias ou amplitude dos movimentos (dismetria), incapacidade de fazer movimentos rápidos e precisos (disdiacocinésia).
Acontece o tremor de intenção, ou seja movimentos involuntários dos membros nas acções voluntárias, causadas por contracções desorganizadas de grupos musculares opostos.
A manifestação mais óbvia do descontrolo de movimento muscular é alteração que surge na marcha, porque nessa situação os músculos estão a ser conduzidos pelo Córtex Préfrontal em modo manual, e o Córtex Préfrontal conduz muito mal.
Marcha Atáxica, típica das lesões do Cerebelo |
Imaginem que estam a pôr um tabuleiro de brownies dentro do fogão, distraídos a pensar como os brownies vão ser fantásticos. A vossa mão toca nas superfícies quentes do fogão e puxam a mão à bruta o que faz com que o tabuleiro de brownies caia ao chão e ficam a dizer mal da vida porque se queimaram e porque ficaram sem brownies.
O que é que aconteceu?
Queimarmo-nos não é bom. Destrói células. Mata um bocadinho do nosso corpo. Isso Não é Bom™.
Por isso é que quando nos queimamos no fogão puxamos a mão à bruta. É um mecanismo reflexo do nosso corpo para nos proteger dos danos aos tecidos da nossa mão.
O estímulo nocivo é sentido pelos nociceptores da pele da mão, essa informação é transmitida através dos neurónios sensoriais à espinal medula, que interpreta o estímulo nocivo, e envia para os músculos do braço a instrução para se contraírem o mais depressa possível para puxar a mão.
A informação viaja pelos neurónios a cerca de 100 metros/segundo e todo o processo demora menos de 0,5 segundos.
Reparem que o estímulo nem chega a passar pelo cérebro ou pelo Cerebelo. Não há tempo para isso.
A mão está a ser queimada e tem de ser protegida o mais depressa possível, não há milisegundos a perder.
A espinal medula a única coisa que faz é enviar ao braço uma ordem vaga e desorganizada de contracção muscular para afastar a mão da fonte do dano o mais depressa possível.
Por isso é que deixamos cair ao chão o tabuleiro dos brownies. A espinal medula não é conhecida por ser muito boa a produzir movimentos elegantes e precisos.
Isso é o Cerebelo, como já vimos, mas o Cerebelo está demasiado longe para que lhe seja pedida a sua opinião. É mais importante proteger a mão depressa, do que garantir que o movimento é coordenado.
Mais interessante do que isto, é que todo este processo acontece sem que seja necessário que o estímulo da dor passe pelo cérebro.
Ou seja, a percepção consciente da dor não é necessária para reagirmos a ela.
A única coisa que isto nos diz é que a dor é um fenómeno muito complexo, mas isso fica para outro artigo qualquer.
Entretanto, não se esqueçam de respirar!
Nao nos responsabilizamos por pessoas a sufocar, porque se eaquecem de respirar!
ResponderEliminaràs vezes apanho uns na consulta que me questiono como é que sobreviveram tanto tempo.
Eliminarde certeza que têm outras excelentes capacidades que não a da comunicação.ou a de tomar banho...
EliminarIsto merece ser aprofundado. Emoções, consciência, reptiliano, amígdala, suas interacções. É um interessante desafio enquanto vamos respirando. Lhamon
ResponderEliminarJá temos falado outras vezes da consciência e de como é difícil definir a maneira como interage com o nosso organismo.
EliminarVou falar mais de vários destes assuntos quando abordar o tema da Consciência Animal!