Pataniscas Satânicas

Pataniscas Satânicas

segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Top 5 de filmes de 2014

5 - Noah - finalmente um filme de fantasia baseado na mitologia cristã. Um excelente filme de fantasia, com óptimas interpretações, uma estética muito característica e uma história muito muito forte.


4 - Guardians of the Galaxy - definitivamente um dos melhores filmes da Marvel até agora, e o meu filme preferido do ano. É extremamente divertido, com personagens invulgares, um ritmo perfeito, diálogos muito engraçados e algum do melhor CGI que tenho visto ultimamente.



3 - Grand Budapest Hotel - o filme mais Wes Anderson que o Wes Anderson já fez. Absolutamente único na sua estética altamente específica e formalizada, com um cast perfeito e interpretações spot-on, numa história bizarra, convoluta e com pormenores hilariantes.


2 - Gone Girl - um dos filmes mais aterradores e bem construídos que já vi. A construção do suspense e do terror opressivo neste filme é genial. As interpretações são quase perfeitas, e a manipulação que o filme consegue das emoções do espectador é assombrosa.



1 - Interstellar - uma obra prima de Christopher Nolan. A mestria do realizador é inegável, num filme que pega no que de melhor há no 2001: A Space Odyssey e no Tree of Life, e cria uma viagem onírica e poderosa sobre ciência, amor e humanidade.




Menções especiais

How to Train Your Dragon 2 - Discutivelmente um dos melhores filmes de animação moderna já feitos. Uma história verdadeiramente épica, uma banda sonora fantástica, personagens gostáveis e verdadeiramente relacionáveis, e excelente animação.



The Lego Movie - Um dos filmes mais originais, peculiares e refrescantes deste ano. Uma história simultâneamente excêntrica e profunda, com um humor espirituoso, 10 piadas por minuto, e a animação mais colorida que eu já vi.


Read More »

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

God Rest Ye Merry, Gentlemen

Na realidade a expressão original era "God Rest Ye Merry" no sentido de "Que Deus vos Deixe Felizes", e na canção o sentimento é desejado aos Gentlemen.
Não são os Gentlemen que são Merry.


Um dia destes tenho de fazer um post sobre os Jethro Tull. Ou dois. Ou Cinco.
Read More »

domingo, 21 de dezembro de 2014

Solstício de Inverno

É inverno.

Os dias são frios, escuros.
Há menos renas, há menos mamutes, há menos bagas.

A tribo esconde-se na caverna, à volta da fogueira. As noites são longas e ameaçadoras. O uivo de predadores ouve-se à distância.

As estrelas, impossivelmente brilhantes, inatingivelmente misteriosas, induzem espanto e medo que nunca se reduziria realmente.

Mas as noites ficam mais longas. Cada vez mais longas. Primeiro imperceptivelmente, depois obviamente.
O velho sábio mede as estrelas, mede o sol. Não há dúvida. O sol está cada vez menos tempo no céu. Está cada vez mais frio.



E se não voltar? E se os dias continuarem a ficar cada vez mais curtos e frios, até não haver nada a não ser escuridão e frio e morte?
É altura de matar os animais, para que os grãos e bagas sirvam para alimentar a tribo durante o frio e a escuridão. Eram os meses da fome, da doença e da morte.

Mas e se o Sol nunca mais voltar?

É preciso fazer alguma coisa, antes que seja tarde de mais. É preciso fazer alguma coisa para o mundo não acabar e não morrermos todos! É preciso fazer o sol voltar!

Acendem-se fogueiras. Sacrifica-se um animal. Sacrifica-se um de nós.
É preciso fazer qualquer coisa.


Mas funcionou. Passados alguns meses o Sol voltou, as neves regressam para de onde vieram e a relva começa a crescer. As renas e os mamutes voltam.

Para o ano é preciso voltar a acender as fogueiras. Não podemos deixar que o Sol desapareça.


É um dos mitos que temos, actualmente. Que as festividades de inverno, que o acender das fogueiras, os rituais eram isso. Festividades.

Não eram.

Não eram uma festa, não era porque era bonito ou engraçado. Nem sequer era porque fazia parte dos costumes ou rituais.

Era magia. E era magia porque se essa Magia não acontecesse, o mundo parava.

Os povos e culturas do paleolítico, neolítico, e até muito muito tarde, acreditavam num mundo que precisava de Magia para continuar a funcionar. Acreditavam que as suas magias e rituais e sacrifícios e fogueiras eram necessários para que o Sol continuasse a circular no céu, e para que depois do inverno viesse a primavera.

O mundo precisava da ajuda da magia para continuar a rodar.

Superstição, crença, magia, rituais, religião...

Feliz Solstício de Inverno


Read More »

sábado, 20 de dezembro de 2014

Faz bem

Eu: o que é que estás a comer?
Mãe: Canela!
Eu: porque é que estarias a comer canela?
Mãe: porque faz bem à Diabetes!
Eu: Não faz na-... pera, estás a comer canela misturada com quê?
Mãe: Com mel e sumo de limão.
Eu: Ah, ISSO é que faz bem à Diabetes


Read More »

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

O início dos Calhaus

Eu vejo-vos a falarem da produtividade. E a criticarem esta geração de preguiçosos. Ah, as virtudes do trabalho árduo para aqui, o valor do esforço e da perseverança contra as frustrações profissionais. Enaltecem os jovens empreendedores.
Porque é bom para a sociedade, porque temos todos de contribuir.
Pois...

Houve um dia, há muitos anos (há cerca de 5 mil anos, mais ou menos) um Rei no meio do deserto que disse assim "Olha, a partir de hoje é que é a contar!" e foi assim o início da civilização.
"A partir de agora os calhaus começam a contar".



E porque os calhaus passaram a contar, ele decretou que se iam empilhar uma data deles. Montes de calhaus, uns em cima dos outros! Calhaus enormes e muito pesados. Uma Pirâmide! Sim, é isso que lhe vou chamar, parece-me um bom nome. Uma Pirâmide para mim, porque eu mereço!


Mas para isso ia precisar de imensa gente para trabalhar. Montes de gente para arrastar aqueles calhaus todos.
Há imensa gente que se espanta e demonstra sempre imensa incredulidade acerca de como os Egípcios construíram as pirâmides. Insistem que usaram magia, ou foram ajudados por alienígenas, ou qualquer coisa dessas.

Não.

Querem saber como é que os Egípcios construíram as pirâmides?
Com muita dificuldade.

Não houve truques nenhuns. Foi muito acartar calhau monte acima, a partir costas. Parece que isso desilude as pessoas. Era mais interessante se fosse magia.

E também costumam pensar que estas pessoas todas eram escravos. Não eram. Na realidade eram trabalhadores pagos. Tinham salário, e férias pagas, e podiam pedir baixa por doença.
Eram empregados. Especialistas de relocalização de calhaus. Altamente treinados.


E todos estes trabalhadores precisavam de comida, de uma indústria agrícola que os sustentasse, e de quem partisse as pedras, e as transportasse rio acima, quem construísse as ferramentas. E todos estes negócios podiam ser alvo de impostos, que iam para o Império, que os usava para pagar aos trabalhadores.
Que estavam a construir uma pirâmide.

Um monte enorme de calhaus apontados para o céu.

A pirâmide estava no centro desta espiral de dinheiro e capital. Todo o fluxo económico do império confluía na pirâmide. A cada pedra da pirâmide poderia ser atribuído um valor monetário cumulativo de todo dinheiro e horas de trabalho que tinham acontecido desde o primeiro gajo a partir a pedra, ao último tipo a pô-la em cima das outras.

É toda a economia de um império centrada, suportada e justificada pela construção de uma pirâmide.
O Faraó, que estava sentado em cima da pirâmide, era imensamente poderoso. Àquele nível o conceito de dinheiro nem fazia sentido. Faraó quer, Faraó tem. A distância que o separava dos trabalhadores, as ordens de grandeza de riqueza que o separavam dos cidadãos normais era tão grande tão grande, que mais valia ele ser Deus.



Não é por acaso que era de facto um Deus na terra. O Faraó era um Rei-Deus. Distante, inatingível, perfeito, cujas vontades eram éditos divinos.
Era assim tão longe que ele estava das pessoas normais.

Mas o Faraó chega ao fim da sua vida, quase a morrer, e reparava que a Pirâmide ainda nem sequer ia a meio.
Então olha, tem de ser o meu filho a continuar isto.
E assim se formavam dinastias. Gerações atrás de gerações de Faraós que iam construindo templos e pirâmides, umas atrás das outras, cada vez maiores e com mais calhaus.

E os egípcios iam atrás. Que escolha poderiam ter? Eram Deuses que lhes mandavam construir as Pirâmides, que lhes pagavam e sustentavam. E eram Deuses e Pirâmides que já lá estavam antes de eles nascerem, e que, obviamente, iam continuar lá. Era assim que o mundo funcionava.


E esta ideia de civilização é tão poderosa, tão eficiente, que é a que se mantém até hoje. Por alguma razão ainda hoje falamos dos Egípcios. As pirâmides ainda lá estão, e só foram sendo substituídas por outras.
Ou seja: o egípcio médio não tinha significativamente mais controlo ou compreensão sobre a sua posição na sociedade do que nós temos actualmente.


Quem de nós realmente percebe o que é que se passa com a economia? Sabemos papaguear algumas palavras, apontar algumas das pessoas que tomam decisões.
Mas uma compreensão completa e precisa da situação é rara.
Eu não a tenho. Se vocês a têm, bom para vocês, mas estatisticamente é provável que estejam enganados.

E também temos pouco ou nenhum controlo sobre o que se passa connosco.

Ou seja: estamos nós, também, todos os dias, a arrastar calhaus monte a cima, a levantar-nos cedo, a preencher papéis, a atender telefones, a resolver problemas, a ser produtivos, para pôr pedras umas em cima das outras.


Para ajudar a construir este grande monolito que é a sociedade. A pirâmide só se tornou um pouco mais abstracta, mais invisível, mas continua lá.



Sabem como é que eu sei?

Porque continuo a ver os Reis-Deuses lá sentados em cima. A tomarem decisões, a mandarem bocas sobre a produtividade e sobre a virtude do trabalho. Numa pirâmide de administratividade corporativista e capitalista (whew!, try saying that three-times fast! My my! Don't we use fancy words!! We must know a lot about this, if we use such big fancy words!)



A produtividade e o trabalho árduo são coisas boas, sem dúvida que são. Mas para quem?

Lá porque nos fizeram acreditar nestas coisas, quem nos disse que éramos NÓS que íamos beneficiar disso?



Estas ideias e crenças não surgiram de forma benévola. Não se implantaram para o nosso bem.
Fizeram-nos acreditar nisto porque rapidamente se aperceberam que cansa arrastar calhaus, e que se houver outros papalvos que os arrastem, melhor.

Portanto vá, larguem a internet e vão trabalhar. É importante.
Read More »

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Pão

Vocês vêem-nos por aí.

São os filhos da revolução de '74, que nasceram no pós-ditadura, de pais que passaram dificuldades e trabalharam imenso e tiveram fome e sofreram a repressão.
Crianças que cresceram com a afluência de uma economia revitalizada, com o influxo dos subsídios da europa nos anos '80.
São aqueles que nos anos '90 no fim da adolescência, viriam a ser apelidados de Geração Rasca, simplesmente porque não tiveram de ultrapassar as mesmas dificuldades que a geração anterior teve de viver. Preguiçosos simplesmente porque a geração anterior não reconhecia os seus objectivos como válidos.

Cresceram bem, o retrato de uma classe média que estava bem na vida. Quase invariavelmente vestiram trajes pretos na faculdade, embebedaram-se muito, tocaram nas tunas, demoraram mais do que deviam a terminar o curso e ainda mais a arranjarem emprego. Mas no fim dos anos '90 e início de '00 ainda era relativamente fácil arranjar emprego. Posições administrativas, vendedores, paper-pushers. Mas com ilusões de grandeza e influência e eloquência.
São estes que vocês mais vêem a mandar bitaites sobre as políticas de direita e o socialismo e como isto é tudo uma vergonha.

Barrigas de cerveja e comezainas a ver futebol, de que sabem muito. Gordos.
Daqueles gordos que não tinham corpo para serem gordos, que parecem que engordaram demasiado depressa e ficaram tufados, sem pescoço.
Nunca foram ao médico. A obsessão com a saúde e o natural e o detox ainda não era como é hoje.
Mas a família chateia-os, as mulheres insistem, e agora que começam a chegar aos 40 e a sentir-se cansados quando sobem um lanço de escadas, decidem ir ao médico.

"Pois é Dr. não percebo como é que estou assim. Eu até tenho cuidado com o que como"

"Ah, sim, estou a perceber"

"Não como muitos fritos, corto sempre as gorduras da entremeada. Como peixe..."

"Peixe?"

"Sim, como muito bacalhau. Não percebo mesmo, não consigo perder peso"

"Pois, eu percebo que isto é uma coisa que o preocupa. E compreendo que sente dificuldade em perder peso"

"É isso mesmo Dr, você parece que lê a minha mente!"

"Deixe-me perguntar-lhe uma coisa... Você come pão à refeição?"

"Sim, um pãozinho"

"Um?"

"Bem, um ou dois"

"A todas as refeições?"

"Não, em todas não..."

"Você come muito pão?"

"Sim, eu como muito pão"

"Hmmmm... curioso! E será que há alguma relação entre esta coisa que você come imenso, todos os dias, durante os últimos 20 anos, e o facto de não conseguir perder peso?"

"Mas eu não como gorduras! Ponho pouca manteiga no pão!"

"Estranho como isso não parece ter funcionado sistematicamente durante estes anos todos..."

"Mas eu até faço exercício"

"Que exercício é que faz?"

"Quer dizer, eu mexo-me muito"

"Ah?"

"Sim, no trabalho... estou sempre a mexer-me de um lado para o outro"

"Estou positivamente boquiaberto de espanto e surpresa em como isso não tenha sido suficiente!"

"Pois, eu também não percebo"

"Vou sugerir-lhe uma coisa... Vai parar de comer pão, parar de beber coca-cola-"

"Como é que você sabe que eu bebo coca-col-"

"Xiu. E não é só coca-cola, é também os outros sumos todos"

"Mas o sumo de laranja é natural! Então o que é que bebo?"

"Água"

"..."

"E vai passar a fazer exercício. Qualquer coisa. Não importa o quê. Tem é de se mexer"

"E vou cortar nas gorduras!"

" >suspiro< Sim, está bem, pode ser..."


Read More »

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

O Papão

Somos crianças, estamos  geneticamente programados para acreditarmos nos nossos pais. Para lhes obedecermos. Faz sentido. Todas as crianças que não acreditaram à primeira que não deviam comer as bagas vermelhas ou fazer festas ao tigre dentes-de-sabre não viveram para passar os seus genes de descrença à geração seguinte. Estamos geneticamente programados para acreditar numa autoridade superior. E porque quando desobedecemos, levamos porrada. Há isso.

Mas um dia crescemos e percebemos que os pais são humanos e falíveis. E deixamos de acreditar. Pomos em causa. O medo diminui. A autoridade dilui-se.

Então surge o Papão ele próprio, a coca, o Homem do Saco. Qualquer figura com a qual se mete medo às crianças para que estas se portem bem. A criança provavelmente nem sabia que essa figura existia até ao momento em que os pais, em tons sussurrados, apelam a uma entidade externa ameaçadora que lhes fará mal de forma indefinida, se elas não se portarem bem e obedecerem.
Eventualmente deixamos de acreditar também nesses.

O Papão precisa de evoluir, de crescer. Então cresce. O Papão passa a ser uma figura cósmica, por definição para além da compreensão humana. Uma entidade mal-definida, muito poderosa, razoavelmente omnisciente, ameaçadora, vingativa, punitiva e eternamente reprovadora.
Sabe o que se passa dentro dos pensamentos privados de cada um. Não há lugares seguros. O Papão internaliza-se. Há pessoas que não sabem viver sem o Papão a dizer-lhes o que é que não podem fazer.

Mas há pessoas que se conseguem libertar. Ou em quem o Papão não pegou. Mas o Papão perdura.

Perdura porque que queiramos quer não crescemos rodeados do Papão. O Papão integra a nossa cultura e a das pessoas à nossa volta. Respiramos e comemos o Papão a vida toda. Mesmo que não se acredite, a essência do Papão persiste. É a crença no valor do trabalho árduo e na privação do prazer,  na necessidade de ajudar sempre os outros em detrimento do próprio. O valor de aguentar o sofrimento e de se ser estóico frente às adversidades.
Quando nos sentimos culpados porque passamos o fim de semana sem fazer nada, sem nenhuma produtividade. Quando sentimos vergonha por admitir que não fizemos aquele esforço extra no trabalho. 

Isso é o Papão implantado na nossa mente, a sussurrar que temos de trabalhar mais, descansar menos.
Mas mesmo assim há pessoas que se libertam do Papão. Que conseguem ver as mentiras e manipulações do Papão e aproveitar o fim de semana. 

Mas ainda assim o Papão perdura.

Perdura em todas as outrad pessoas que acreditam no Papão. Mesmo que não saibam que acreditam. Não podemos rir muito alto, não fica bem criticar as pessoas, não devemos gozar com coisas sérias, há palavras que é feio dizer em público. É a convenção social, é o politicamente correcto, são as boas maneiras, são as regras arbitrárias. E neste Papão não é preciso acreditar, basta que todos os outros acreditem. 

E pode parecer que o podemos ignorar, pode parecer que podemos quebrar estas convenções, mas a longo prazo as consequências acumulam-se e tornam-se notórias. O sarcasmo é criticado, não é produtivo, as eminências devem ser respeitadas, por ridículas ou incoerentes que sejam.
Todos os chefes estão bem barbeados e têm crocodilos na camisa. Todas as chefes de serviço acreditam na virtude do trabalho árduo e no valor do sacrifício pessoal.

O Papão persiste nas estruturas de poder e autoridade. Onde mais poderia estar?
A vida não corre bem a quem desafia o Papão. Até podemos gozar com ele, chamar a atenção à sua existência, mas desafiá-lo é arriscado. 

Não há muito tempo o Papão queimava na fogueira quem discordava dele, ou arrancava as unhas a quem dizia coisas  desagradáveis.

É saudável ter medo do Papão.
Read More »

domingo, 30 de novembro de 2014

Cyberpunk

Cyberpunk is all about the notion of a worn future, that is so antithetical to the notion of hygiene and futurism of 2001 and the Jetsons.


Let's be clear on this: the Jetsons are laughable. No doubt about it. But they are also endearing. You can't help but like them and what they represent which is a highly idealized form of perfect American Dream.

Even 2001 represents a departure from the Jetsons in that it presents you with a much colder and uncaring future and technology. The robotic housemaid in the Jetsons suddenly becomes a menacing deep red dot on a wall that speaks in a monotone.



The Jetsons represent all of our best hopes for the future, they are how we wish things would happen.
And that is why we are drawn to stuff like Cyberpunk or post-apocalyptia.
Because we see in them the leavings of this idyllic future. They are the cold hard mirrors of our hopes and dreams.

And we can't help but laugh and be cynical about the Jetsons, because we've all grown up and became just a bit more disillusioned. Enough to know that the Jetsons will never happen.
But whenever we see the old Coca-Cola ads in giant blimps in Bladerunner or the Nuka-Cola ads in billboards on destroyed highways in Fallout 3, we can't help but feel just a bit heartwarmed. Because those are the reminders of what could have been.




Things wouldn't feel quite as desolate or hopeless or bleak if the cozy outdated songs of the twenties weren't playing over the nuclear wasteland or the urban sprawl.
They are an essential part of it. Meaning that the Jetsons, and everything about the idea of them, need to have been a possibility that never happened, so that Cyberpunk and post-apocalyptia can work fully.
If you try to build Cyberpunk or post-apocalyptia without these elements of a could-have-been future that somehow became corrupted, you're not doing it right.

And in the end, Cyberpunk and post-apocalyptia come from, and represent, our fears about the future. They are, in fact, our way of dealing with these fears and face them. To make them manageable.
They are also a way to remind those in charge, and ourselves, that things can go sour very quickly.


Read More »

quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Sobre o contínuo

Um dia escuro, numa sala iluminada de luzes amareladas, ouvi um Professor falar sobre merda.
Merda com sangue.

Fiz o meu caminho por entre as ondas de multidão à saída no metro, e forcei a porta de vidro automática, depois de perceber que o cartão magnético tinha escolhido o dia para embirrar comigo. ''Porque é que estou sempre atrasado para tudo?''
Estava a chover o pior tipo de chuva miudinha. Aquele que molha parvos e espertos.
Acelerei o passo, por entre a multidão de Sete Rios, até dobrar a esquina. Continuei aos ziguezagues, abrigado de varanda em varanda. Os guarda chuvas não foram feitos para mim. Perdi dezenas, até perceber isso.

Finalmente vejo a fachada do Instituto Português de Oncologia! Cheguei, e o meu cérebro decide finalmente que desculpa balbuciar, na improbabilidade de alguém questionar porque é que passam 20 minutos depois do início da aula, e eu só cheguei agora. Depois da segunda aula, é difícil convencer alguém de que andamos perdidos à procura da sala, mas a minha imaginação tem limites às 8 e meia da manhã.

Chego ao piso da Cirurgia. Vou à secretária, e pergunto se sabe onde está o Dr. Ela aponta-me uma sala à esquerda, e finalmente chega o momento. Atravesso a porta a calcular o sítio onde me vou sentar entre os colegas, enquanto finjo que o facto do Dr. ter parado de falar, não tem nada a ver comigo. Sento-me, amorfo, com olhos de carneiro mal morto, para afastar as atenções dos olhares reprovadores. Passado tempo suficiente, ele continua a falar, e eu ouço atenta e interessadamente. Onde está a folha de ponto? Porra, onde está a folha de ponto? Os meus colegas não me retribuem os olhares, e perco-me entre expressões amorfas, de carneiros mal mortos.

''... e é por isso que hematoquézias não quer dizer nada. É um termo inespecífico. Podem ser fezes com coágulos, ou fezes em cor de tijolo... E por causa de variações na velocidade do trânsito, de dificuldade na estimativa do volume, é difícil dizer a origem, ou a causa da hemorragia.''

Eu lembrava-me disto. Medicamente falando, o aspecto das fezes de alguém com suspeita de hemorragia gastrointestinal, permite ter uma ideia da localização da hemorragia. A regra em que os livros de semiologia concordavam, é que sangramento do doudeno para cima, fazia um desgraçado defecar alcatrão, e abaixo disso, uma paleta de misturas e combinações da sangue com merda, até a hemorragia ter localização no recto, e aí o desgraçado defecava o que os médicos chamam, de maneira tranquilizadora, ''sangue vivo''.

''...e é por isso, que hematoquézias não servem para nada. Os doentes fazem colonoscopias que frequentemente estão normais. E existem causas de hemorragia acima do ângulo de treitz, que podem manifestar-se por hematoquézias, se a motilidade intestinal estiver particularmente acelerada. O que os livros dizem, na prática, pode ser muito diferente. A realidade das coisas não cabe em caixas de diagnósticos. A realidade é fluída e contínua. E é assim que devem ver os doentes com hematoquézias. Podem estar a sangrar de qualquer lado, em vários metros de intestino.''

Holds true. Os psiquiatras perceberam isto há mais tempo. Muitos medicamentos, desenvolvidos originalmente para uma doença mental/neurológica, mostraram-se muito úteis em várias outras doenças mentais. Os antipsicóticos podem ajudar nas depressões profundas. Alguns anticonvulsivantes são excelentes estabilizadores do humor, ao passo que outros controlam a dor neuropática. As benzodiazepinas foram feitas para dormir e acalmar, e algumas são excelentes relaxantes musculares. Os antidepressivos podem ser usados para tratar a ansiedade, a anorexia nervosa, e mesmo a ejaculação precoce.

Muitos sintomas são contínuos que podem aparecer com intensidades variáveis em doenças diferentes. As doenças são caixas onde nem toda a gente cabe. As equações de sintomas que estão na tampa de cada caixa, não são suficientes para traduzir todas as realidades que podem decorrer de estar doente. Prova disso é existirem diagnósticos-saco, onde se arruma o que não cabe em mais lado nenhum... fadiga crónica, fibromialgia, cistite intersticial, cólon irritável, síndrome da boca queimada, manifestações somatoformes, ou o curioso conceito: ''sintomas não explicáveis medicamente''. Não sabemos o que é... mas sabemos o que não é... arranjámos uns rótulos para a nossa ignorância, e repetimos placidamente: ''é dos nervos, vizinha, é dos nervos...''

Muitas vezes não é bem claro onde uma classificação acaba e a outra começa.  2+2 são 4... mas só quase sempre... Uma epigastralgia com 2 vómitos e febre é uma gastroenterite, até ser uma pneumonia.  E a incerteza existe sempre... pode ser tolerável para alguns, mas certamente não para toda a gente.
Tudo o que podemos fazer é pensar, fundamentar as nossas escolhas, e agir de boa fé. Sabendo que podemos estar errados, e que estarmos errados, não decorre necessariamente de termos agido mal.
E saber que o papão não existe, e que a homeopatia é uma fraude.
Mas não digam estes dois últimos em voz alta.
Read More »

sábado, 15 de novembro de 2014



I'm feeling rough, I'm feeling raw, I'm in the prime of my life.
Let's make some music, make some money, find some models for wives.
I'll move to Paris, shoot some heroin, and fuck with the stars.
You man the island and the cocaine and the elegant cars.

This is our decision, to live fast and die young.
We've got the vision, now let's have some fun.
Yeah, it's overwhelming, but what else can we do.
Get jobs in offices, and wake up for the morning commute
.

Forget about our mothers and our friends
We're fated to pretend
To pretend
We're fated to pretend
To pretend

I'll miss the playgrounds and the animals and digging up worms
I'll miss the comfort of my mother and the weight of the world
I'll miss my sister, miss my father, miss my dog and my home
Yeah, I'll miss the boredom and the freedom and the time spent alone.

There's really nothing, nothing we can do
Love must be forgotten, life can always start up anew.
The models will have children, we'll get a divorce
We'll find some more models, everything must run it's course.

We'll choke on our vomit and that will be the end
We were fated to pretend
To pretend
We're fated to pretend
To pretend

Yeah, yeah, yeah
Yeah, yeah, yeah
Yeah, yeah, yeah
Yeah, yeah, yeah
Read More »

Estou velho

Eu já sabia que estava velho. É uma coisa inevitável. O mundo já está a deixar-me para trás. Mas por vezes esqueço-me, ou quero esquecer-me.  

Outras vezes sou forçado a lembrar-me.

Lembro-me de me rir da minha avó que quando falava ao telefone, falava muito alto para que a voz chegasse bem ao outro lado.

No outro dia estava a jogar Skyrim e precisava de um guia de Enchanting. Por ser muito preguiçoso decidi usar o meu smartphone para procurar na net. Por ser ainda mais preguiçoso, decidi que nem sequer queria tirar as mãos do comando da Playstation.
Carreguei apressadamente no botão para activar o reconhecimento de voz e comecei a dizer muito lentamente e claramente "SKYRIM. ENCHANT-" e o Google deu-me resultados do Skyrim.

Claro.

Senti-me adequadamente velho e disse "skyrim enchanting guide" e o google deu-me resultados.
You see, é um smartphone. É um objecto ao qual alguém achou que era apropriado apegar o adjectivo smart. Ele percebe facilmente que eu quero um skyrim enchanting guide sem que eu tenha de o gritar pausadamente.
Ninguém achou "Ah, esta pessoa merece o adjectivo smart antes do nome dela!".

Chamar-lhe um telefone ou telemóvel, já é redutor. É um pequeno computador ligado a uma rede de informação invisível que contém todo o conhecimento humano. Não precisa que eu fale pausadamente para me perceber.

"Não, avô. Já te disse dezenas de vezes: nos links de Internet só tens de pensar uma vez"
Read More »

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Man of Steel (2013)


Raios que este filme é aborrecido.

Eu geralmetne até gosto muito de filmes de super-heróis, mas este filme é particularmente aborrecido.

É difícil apontar o dedo a uma falha flagrante que torne o filme mau, mas acho que consigo dizer alguns dos aspectos.

A história não tem ritmo nenhum, é só uma sucessão de acontecimentos que, apesar de vagamente lógicos, não conseguem dar movimento à narrativa.

A personagem central, o Super-Homem não tem nenhum interesse. É perfeitamente uni-dimensional, o conflito interno é extremamente forçado. Um dia descobre que consegue voar, e é isso que vemos da sua aprendizagem.

As personagens secundárias são ainda mais aborrecidas e esquecíveis. O vilão parece e fala como um atrasado mental, as suas motivações são igualmente superficiais.

Os diálogos são sensaborões e as interpretações mecânicas e quase sem entoações.

Tive dificuldade em ver até ao fim, de tão aborrecido que era.

Quer dizer, a determinado momento o Super-Homem está algemado, e isso levanta ideias tão boas que podiam ter sido tão bem aproveitadas para fazer uma história interessante.
Mas não.
Só há prédios a rebentarem e muita porrada. Nada contra essas coisas, notem, mas... soube a muito pouco.

A banda sonora é porreira, no entanto.
Read More »

sábado, 25 de outubro de 2014

Pikachu + acid = Progressive Rock


Read More »

Flora Saprófita


Hoje de forma aleatória (e se formos a ver bem o que é que não é aleatório?) deparei-me mais uma vez com o conceito de flora saprófita.

O que é que isto significa?

Por definição saprófitos são micro-organismos que se alimentam de matéria orgânica morta. Ou seja são bactérias, fungos, líchens, etc, que se alimentam dos restos orgânicos de tudo o resto que esteve vivo.
Ou seja, são seres vivos microscópicos que comem os restos proteicos nutritivos de outras coisas vivas. Estão no fundo do fundo do fundo da cadeia alimentar. Tudo o que é vivo e usa carbono, nitrogénio, oxigénio e hidrogénio (ou seja, tudo o que é vivo), acaba por ver estes seus elementos a serem reciclados por saprófitos.

E o que são estes saprófitos? Há muito a dizer acerca deles. Mesmo muito.
Para simplificar vamos falar só de bactérias.

Resumidamente:
Há 3 900 000 000 (três mil e novecentos milhões) anos surgem os primeiros seres vivos sob a forma de células.
Há 3 500 000 000 (três mil e quinhentos milhões) anos surge a primeira importante divisão evolutiva, os archea, e, portanto, o último antecessor universal.
Há 2 500 000 000 (dois mil e quinhentos milhões) anos as placas tectónicas formam-se.
Há 1 850 000 000 (mil e oitocentos e cinquenta milhões) anos surge a segunda importante divisão evolutiva, com a separação das células procarióticas (vulgo bactérias) e das células eucarióticas (que compõem tudo aquilo que é vida e que conseguimos ver a olho nu)

Portanto mais de 2 mil milhões de anos entre o surgimento da vida e o aparecimento dos três grandes grupos de vida que existem actualmente: archaea, procariota, eucariota.

Nós somos Eucariota. Nós e tudo o resto... ursos, baleias, pássaros, répteis, peixes, estrelas do mar, lesmas, flores, relva, pinheiros, algas, cogumelos, corais, amebas. Muita coisa, toda com a mesma estrutura celular básica.

Contra nós estão os procariotas, as bactérias. (os archaea têm, no geral, uma bioquímica tão diferente que mal interagem connosco).

O que é que fazem os procariotas? Comem nutrientes. Que nutrientes? Não são esquisitos, portanto qualquer nutriente.

Nota importante: nós somos feitos de nutrientes.
Os procariotas comem-nos a nós.

Não é nada de pessoal. Os procariotas estão a comer-nos (a nós e aos nossos antecessores eucariotas) desde que existimos.
E estão por todo o lado. Ok, sim, é verdade, são pequeninos, e nós (os eucariotas) pesamos mais do que eles. Mas eles são mais. E estão por todo o lado. E sobrevivem em quase todo o lado. E estão cá há mais tempo do que nós. A comer-nos.

Quantos há? Estima-se que existam 5 x 10^30 procariotas no planeta (500000000000000000000000000000). Onde estão? Desde a Estratosfera até rochas a quilómetros de profundidade.
Cada um de nós transporta cerca de 100 triliões de bactérias no nosso intestino. 10 vezes mais do que células que nos pertencem (que tenham o nosso código genético).

O que é que estas bactérias todas fazem? Comem-nos.
São a nossa flora saprófita. São a multidão de bactérias que nos coloniza no canal de parto da nossa mãe (por ingestão de fluidos vaginais) e que nos vai decompor quando morrermos, comendo-nos de dentro para fora.

Estarmos vivos é uma vitória temporária enquanto as bactérias não nos comem. Qualquer deslize do nosso sistema imunitário e elas começam a comer-nos prematuramente.

Porque é que acham que os antibióticos são uma grande coisa? Só em 1928, com o Fleming a descobrir a penicilina, se começaram a usar sistematicamente substâncias que combatiam as bactérias.
Só por acaso a penicilina vem de um fungo, outro saprófita.

Os procariotas começaram a comer eucariotas desde que estes surgiram há 1850 milhões de anos. Ainda não pararam. Vão comer-nos até desaparecermos todos. Até ao fim.

Os últimos seres vivos da terra vão ser archaea.
Huh? Aposto que estavam à espera que dissesse procariotas.  Não não, vão ser os archaea, porque esses filhos da puta são quase impossíveis de matar. Não, a sério, eles comem pedras e sobrevivem no espaço.
Read More »

terça-feira, 21 de outubro de 2014

Cocaína

''Tenho falta de um medicamento que me dê força de manhã... Para fazer a minha vida... ''
e que medicamentos faz?
''Estes''
hum
''Tomo estes de manhã, estes à tarde, e estes, à noite...''
sim, e como se tem sentido?
''Não me sinto bem. Todos estes medicamentos me fazem mal.''
hum hum... e como é que acha que eu posso ajudar?
''Não sei bem... Trouxe aqui a lista dos medicamentos que tomo, para mostrar. E gostava que escolhesse aqueles que me estão a fazer bem, e aqueles que me estão a fazer mal... Para eu saber...''
hum, consigo começar a imaginar o que possa ter levado alguém a iniciar alguns destes...
''O que eu precisava mesmo, é de um que me desse força de manhã. Para eu fazer a minha vida''
hum hum...
''e não posso deixar de fazer os meus normais...''
hum hum....
''Então o que acha...?''
Read More »

sexta-feira, 17 de outubro de 2014

Collected ramblings of a madman

''Isto é algo que as pessoas precisam de saber. Alucinar não é ver gafanhotos gigantes a passearem de mão dada com elefantes cor de rosa. É muito mais pessoal. É perceber que o teu nariz é a coisa mais estranha da tua cara. É interpretar alguma coisa que esteve à tua frente a vida toda, hoje está totalmente diferente. Ver que os teus dedos são curtos demais em relação à memória que tens deles, que a explicação e os porquê se esvai entre eles. Alguma coisa que sentes. Não é necessariamente alguma coisa que vês.

Dizes que alucinar é uma percepção sem objecto, que me refiro distorções de percepção/pensamento. Digo-te que essa divisão é artificial, as experiências sensoriais são integrais com a percepção. Porque têm apenas um observador.

The shadows flicker a lot more than usual, for a sun that has been shining all day. A luz à qual observas as tuas emoções também é diferente. Mais viva e carregada. 'Sentes' as tuas emoções como se elas não te pertencessem. Porque sentir alegria/elação/euforia, altera a maneira como te vês a ti próprio e o mundo que te rodeia. Se alguma coisa te tirar do centro dessa relação, consegues aperceber-te das mudanças subtis que as emoções operam na tua percepção de estímulos.
All the dials and levers working. Sentes-te como se tivesses sido alexitímico a vida toda. E também que apenas começaste a entender isto. Por isso não percas demasiado tempo com a luz. É apenas a luz da mesa de cabeceira, numa noite estranha, em que acordaste desgrenhado, fora de ti.
Levanta-te e anda. Anda ver o nascer do sol. Os raios laranjas a rasgas e a colorir as nuvens, os cirros coloridos de tons violáceos.

Dizes que falo de cortinas de fumo, de crenças sobrevalorizadas. Nada palpável. Mas não estou a fingir que sei do que estou a falar. Tento descrever impressões subjectivas. Só quero chamar à atenção que a periferia das tuas percepções encaixa de maneira cada vez mais aberrante na realidade. Um termo cuja substância se dilui numa poça, de onde nasce um arco íris. Se fechares os olhos, as cores aparecem.
E isto é só o princípio.''

''Consigo perceber o pânico de alguém que vê a sua cara pela primeira vez ao espelho, como se pelos olhos de outra pessoa. Produz um sentimento análogo a ouvir a minha voz numa gravação. Mas mais bizarro. Tenho que fazer a barba... Nós somos feios em comparação com a ideia que temos de nós próprios, metida atrás dos nossos olhos.''

''Quebra de continuidade. Ao longe o outono faz as árvores restolharem. O vento desenha caminhos por entre os arbustos e as ervas rasteiras, os gatos brincam uns com os outros num recanto. Subitamente percebes que tens dificuldade em evocar palavras. Linguagem.  Não é que as palavras não venham, se encurraladas, é só que se tornaram desnecessárias. As emoções são suficientes para interpretar o mundo à tua volta, com toda a complexidade e reactividade que a linguagem permite.
Não penso, mas sinto. Será que existi naquele momento? Será que interessa?''
Read More »

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

New Adult: os romances Harlequim com um twist

Eu gosto de ler. Sempre gostei de ler, mas como tudo na vida este gosto alterou-se com os anos. Se no inicio li histórias adequadas para a idade, na faculdade tornei-me uma snob relativamente à leitura. Eu não lia qualquer coisa. Eu lia histórias com qualidade comprovadamente superior. Eu lia autores existencialistas e críticos sociais e era uma deprimida… Yup. Quando lês demasiado Dostoyevsky nasce um desespero em relação ao mundo, uma apatia continuada e uma incapacidade inexplicável de perceber que existe uma possibilidade de mudança. Ou simplesmente a minha depressão maravilhosa adorava banhar-se nas histórias de personagens com finais miseráveis.

Após estes anos gloriosos de leituras profundas que moldaram a minha personalidade de maneira incontornável, a verdade é que a depressão passou. E não, não deixei de gostar de ler clássicos ou livros de qualidade, mas passei a apreciar (e a culpar-me muito por isso) ler livros com finais felizes, romances que me façam sorrir. Descobri todo um mundo de romances contemporâneos, históricos, fantasia, steampunk, paranormal e distopia. Tornei-me numa leitora relativamente aleatória. Sim, continuo a seguir a lista dos “1001 livros a ler antes de morrer”, mas sou muito mais comedida. E como sou fan do Goodreads descobri um género extraordinário: New Adult.

Resumidamente, este género é o somatório de todos os clichés do Young Adult (típica personagens principais decalcadas do “Twilight”, insta-love, triângulos amorosos, dinâmica amor-ódio, declaração amorosa dramática, rapaz possessivo e anulação da personagem feminina em prol do “amor”), mas com descrições de cenas sexuais desde os primeiros capítulos da história. As descrições sexuais fariam corar as escritoras do “Harlequim e Bianca” que via a minha mãe ler nas velhas praias de Quarteira. Assim tão pormenorizadas, com tudo para todos os gostos. É só uma questão de procurar. Deixem-me apenas avisar, comparativamente com o que é descrito nos livros não há homem que se compare. A quantidade e qualidade sexual descrita mata qualquer desejo pelo vosso parceiro atual… Just saying…

E nem é componente sexual exagerada sem nexo que me faz realmente confusão nestes livros. O que me preocupa e não me faz sentido é ter lido partes de livros em que as violações são justificadas pelas autoras. Em que a violência verbal e física é demonstrada como sendo uma prova de carinho e amor. E isto arrepia-me. Desculpem, provavelmente estou a ser moralista, mas ler um livro em que o raciocínio da personagem feminina após ser violada é “Ele utilizou o meu corpo sem a minha permissão, mas é tão bonito e musculado”, dá-me náuseas. Ler um livro em que tudo aquilo que ainda hoje se luta em termos de igualdade de géneros é jogado para o lixo e a realidade é distorcida e apresentada a jovens como sendo algo aceitável e até mesmo um objetivo a alcançar diz que não avançámos muito como seres humanos.


E porque é que me interesso? Bom, primeiro, porque estudos têm demonstrado um aumento da violência entre casais jovens. Segundo porque eu trabalho também com jovens e noto uma aceitação das vicissitudes da vida como se fosse algo a aspirar. Terceiro, porque sou um ser humano do sexo feminino que tem um imenso orgulho do trabalho que tantas mulheres tiveram para que eu hoje pudesse ter os direitos que tenho. Quarto, porque violações e violência simplesmente não são aceitáveis… Quinto, porque o Ricardo e o Gui estavam fartos de me chatear a dizer que não contribuía em nada para este blog, e assim calo-os por mais um ano. :P
Read More »

terça-feira, 14 de outubro de 2014

O Futuro é Biónico

"We do what we must, because we can"

É o centro da nossa progressão científica. Fazemos as coisas porque estão ao nosso alcance, porque podemos. O que quer que seja possível vai necessariamente acontecer.

É uma espécie de corolário da lei de Murphy, ou a lei de Murphy é um corolário desta, não sei, não interessa, adiante.

Case in point.

De certeza que não começou aqui, mas é um ponto tão bom como qualquer um para ilustrar o que quero dizer:


É uma prótese vitoriana. Tem 150 anos. Alguém que não tinha um braço arranjou um braço artificial, mecânico. Transformou-se numa junção de homem e máquina. Porque era possível.

A tecnologia das próteses avançou muito desde então...



A versatilidade e fluidez destes movimentos é espantosa. O futuro é isto.

O futuro também é Olimpíadas só para pessoas com próteses biónicas.


Obviamente que tinham de ser Olimpíadas separadas, seria injusto pôr pessoas amputadas a competirem contra pessoas sãs. Porque as pessoas sãs estão em desvantagem. A discussão já existe sobre se os atletas com próteses têm uma vantagem injusta sobre os atletas sãos, mas é uma discussão que não vai durar muito tempo. Em pouco tempo a tecnologia vai determinar uma vantagem clara.

Desde há anos que os recordes estabelecidos nas Olimpíadas são feitos por margens cada vez menores. O que faz sentido. Há limites para o que o corpo humano, estruturalmente, consegue atingir. Mas recorrendo a próteses, subitamente há todo um novo campo de recordes que podem ser batidos! Por pessoas que são ciborgues!

E o que é que vai acontecer nestas Olimpíadas? As empresas de biotecnologia vão poder mostrar os seus protótipos mais avançados, vão competir entre si para terem melhores resultados, provavelmente recorrendo a modelos mais potentes e radicais.

Entretanto os japoneses querem Olimpíadas só para robots.

Isto significa que num futuro próximo, provavelmente ainda durante as nossas vidas, veremos Olimpíadas nas quais robots competem contra ciborgues!

ISSO eu via na televisão!
Read More »

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

A história que me contaram sobre o Papão (com detalhes sórdidos...)

Fomos quem fomos. O Passado não pode ser alterado. Mas se alguma vez, aquilo que fomos nos permitiu sentir felicidade em algum momento, teve necessariamente que ter sido influenciado por aspectos positivos. Algumas coisas boas aconteceram. Podemos ter passado por meses de preocupações, a sentir a perseguição da vida, que, se a dada altura percebemos que não temos nada real a perseguir-nos, sentimos-nos bem. Equilibrados com nós próprios.

Para este equilíbrio ser possível, foi relevante descobrir que Papão não existe. Apesar de não nos podermos dar ao luxo de parar de cavar buracos, sabemos que não existe nenhuma autoridade divina, nenhum caminho sagrado. Ninguém nos pode vai mandar para um poço em chamas, com monstros, criados pelo papão durante a sua adolescência, cujo único propósito de existência é torturarem aqueles de nós que, em vida, desobedecerem ao papão. E isto portanto, seria eternamente. Para sempre.

O papão bom que vem no livro a seguir - uma sequela chamada novo testamento, está a lutar contra o mal (as asneiras que fez no primeiro livro), mas não conseguiu desfazer isso da tortura eterna, para malta mal comportada. O que foi uma pena. Por isso teríamos que continuar a cavar buracos. Isto, apesar do papão ser um gajo tão porreiro, que mandou para a terra o filho dele. O Papão engravidou uma menina, mas com toques mágicos, nada de andar aí a pôr a pila em monhés do médio oriente. O Papão ainda apanhava uma comichão na virilha, e o marido da senhora podia ficar incomodado. Mal o marido da senhora soube a notícia da divina concepção, pensou logo que devia começar a ter relações com a esposa com mais regularidade, para pelo menos ter uma hipótese. Mas não se atreveu a tocar na Maria até o puto nascer... Eu percebo... Um alien põe qualquer coisa na barriga da tua mulher, a última coisa que queres é meter lá a pila. Sei lá o que pode acontecer. Até podes levar uma dentada. José pagou a cobardia, porque assim, o pénis do filho do Papão, foi o primeiro a atravessar a vagina da esposa, sem recurso a poderes mágicos, claro. E é assim que tu vês como o Papão é espectacular.

Imagino que o José tivesse ficado preocupado com a perspectiva do Papão agora começar engravidar-lhe a esposa de tempos a tempos. E tendo o Papão poderes mágicos, sabe-se lá a frequência com que lhe conseguia engravidar a esposa. O Papão pode fazer tudo, por isso teria que ser bom na cama e provavelmente seria extra fértil. Bem, mas estou a perder-me...
O nascimento foi importante o suficiente, para 2000 anos depois, em algumas sítios, todas a família se juntarem, para festejar os anos do filho do papão.

Depois, ele passou a adolescência a dizer-nos para não nos chatear-mos tanto uns com os outros, e para dividirmos o que temos irmãmente. Não existirem tão poucas pessoas com todos os recursos, e a maior parte a passar fome. O filho do papão do Papão armou-se em sindicalista, e na altura a vida podia correr muito mal aos sindicalistas... o papão do primeiro livro já tinha escrito no plano divino  que era melhor o filho dele levar um castigo valente, tipo pregarem-no a uns paus de madeira. O papão da sequela depois arrependeu-se e ressuscitou o filho, mas mandou-o lá de volta para o condomínio privado onde o papão mora, não ficou cá com a gente, e foi uma pena. O condomínio privado onde tuuudo é perfeito. E no entretanto, o filho dele não tem dito muito. O que é uma pena. Está, no entanto, previsto que o filho do papão vai voltar para por ordem nesta merda. So look busy.


Read More »

segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Coisas Horríveis IV - um pedido de desculpas

Ok, pronto, parem com os e-mails, a minha caixa de correio já não aguenta.

Peço desculpa pelo que escrevi, claramente ultrapassei uma linha e ofendi muitas pessoas.
Sensibilidades foram magoadas, susceptibilidades foram injuriadas, moralidades foram ultrajadas. Toda a gente tem uma opinião, e há outras opiniões diferentes. É preciso respeitá-las, não é?

Não tenho o direito de dizer coisas que vão magoar os sentimentos das outras pessoas, por muito estúpidos que eu ache que sejam esses sentimentos. Quer dizer, se andássemos por aí a dizer coisas desagradáveis uns aos outros só porque sim, onde é que isto ia parar?

E eu compreendo que dizer este tipo de coisas acerca de crianças é sempre inapropriado, sobretudo quando estamos a falar de crianças deficientes. É um assunto sensível eu compreendo.

Porque quer dizer, se começamos a dizer tudo o que nos vem à cabeça, onde é que isto vai parar? Corremos o risco de que as outras pessoas ouçam as nossas ideias e se ofendam! E magoamos os sentimentos delas!!!

Mesmo que estas pessoas adiram com demasiada convicção a ideas e crenças abstractas, largamente arbitrárias acerca do que é apropriado ou não. São as ideias delas, não tenho o direito de vir brincar com isso ou mostrar como são ridículas. Essas pessoas têm o seu direito.

E quer dizer, sobretudo quando no mesmo contexto falo de cães. Envolver cães E crianças deficientes? O que é que eu pensava? Que as pessoas iam simplesmente reconhecer o exagero absurdista pelo que é e pôr a ideia de lado de tão parva e desprovida de sentido que é depois de darem uma gargalhada?

Claro que não, as pessoas têm as suas crenças e têm o direito a essas crenças, e eu não tenho o direito de sair do meu caminho e gozar com essas crenças, por muito superficiais que me pareçam. É preciso respeitinho.


Mesmo que tenham sido só palavras, sem nenhum impacto real ou mensurável, ofensivas apenas para quem se importa, e essas pessoas possam simplesmente não olhar para o que eu escrevo.
Não tenho o direito de dizer determinadas coisas, há claramente coisas que são demais. Toda a gente sabe isso, e eu devia sabê-lo, também.

Acho que o pior foi mesmo a comparação entre os cães e as crianças deficientes. Isso é errado. Não se pode deixar acontecer. As pessoas iam ofender-se.

E nem posso dizer que não sabia. Claro que sabia, foi por isso que o fiz. 
Diverte-me o facto de isto ofender as pessoas. Põem-me uma linha à frente e um sinal a dizer "Não ultrapassar esta linha" e eu tenho o impulso de pôr o dedo do outro lado da linha.

Que as pessoas se sintam ultrajadas e pessoalmente magoadas quando pego em ideias e brinco com as atribuições quasi-sagradas que elas fazem delas, e as mexo e remexo com o único propósito de chegar a uma frase que tenha o maior impacto e a maior ofensividade possível, especificamente dirigida para essas atribuições arbitrárias acerca do que se pode dizer ou não.
Diverte-me.

É preocupante a quantidade de tempo e energia que dispendo a pensar sobre este tipo de coisas...

Acho que o que ofendeu mais as pessoas até foi a inversão da comparação, ou seja, que de igual forma as crianças deficientes seriam comparáveis a cães.

Compreendo quando as pessoas se sintam atacadas de uma forma subtil e sub-reptícia, quando eu com uma dúzia de palavras as faço considerar noções horríveis, mesmo que estas sejam concretamente observáveis. Sobretudo se forem concretamente observáveis.

Quer dizer, eu não digo explicitamente que babarem-se, cagarem por todo o lado e ficarmos felizes quando aprendem truques são alguns dos termos nos quais são comparáveis.
Eu não digo isto explicitamente, mas o facto de levantar a comparação faz com que as pessoas pensem sozinhas nestes pontos de comparação, e isso fá-las sentirem-se mal.
Sobretudo mal porque não fui eu que o disse, só pus a primeira ideia dentro da cabeça delas, e elas chegaram lá sozinhas.

Portanto o que as ofendeu mais foi o que elas pensaram sozinhas. Eu só chamei a atenção para o facto de que essas ideias já lá estavam, potencialmente. É sobretudo isso que as chateia, a dificuldade em aceitar que parte da responsabilidade dessas ideias é delas.


Há ideias que não deviam ser expressas, mesmo que sejam ridículas, porque podem ofender alguém! E não podemos permitir que as pessoas se ofendam, pois não?
Isso justifica que algumas ideias sejam censuradas. Há ideias que merecem ser censuradas, é isso?

Mas compreendo que se zanguem comigo.

Havia uma linha e eu ultrapassei-a.

O Papão não gosta.

Mea culpa.

Vou tentar ser mais simpático no futuro.
Read More »

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

A Clockwork Orange

Li este livro recentemente. E vi o filme.

As minhas críticas de cinema são tão simples como a minha bagagem cinematográfica.
Gostei do filme. 
E agora quero falar de coisas absolutamente tangenciais. 

No prefácio o autor lamentava o facto de a versão americana não incluir o último capítulo. 
Também não retratado no filme, neste capítulo da versão inglesa, o protagonista retoma a vida que levava, de violência gratuita e absoluto hedonismo, até encontrar um dos quatro vândalos com que confraternizava no início. 

Pete. Pete tinha uma noiva e estava prestes a casar. Ia ter um filho. E este facto tem o impacto catártico em Alex, por que esperamos o livro todo. Ele imagina-se a procurar uma noiva e a ter um filho. Um pequeno Alex. E subitamente abandona o novo grupo de vândalos, no bar onde tudo começou. Para se deitar cedo.

What's it going to be, eh? 

Alex têm dimensão de crescimento pessoal na versão inglesa. Que é o propósito da história. Será que o ser humano é passível de mudança, ou somos apenas matéria orgânica com propriedades mecânicas? Mais precisamente, será que somos reabilitáveis?

A questão é filosófica. E como tantas outras, sem resposta. Parece-me que ficamos reféns de conceitos que não reflectem a realidade completa. Será que mudamos? Claro que mudamos! Mudamos para nos adaptar à realidade. Será que somos matéria orgânica com propriedades mecânicas, num ambiente fundamentalmente determinista? Somos roldanas no mesmo sentido que uma paramécia desliza numa gota de água à procura de proteínas? The jury is still out on that one, mas é cada vez mais inevitável responder que sim. 

Somos laranjas mecânicas, ofendidas com a perspectiva de não termos escolha, senão sermos o que somos. Por isso caímos nos mesmos hábitos, nos mesmos erros. 

A resposta não é satisfatória, porque a pergunta não faz sentido. Temos tanta capacidade de compreender o nosso livre arbítrio, como a paramécia tem de cogitar sobre porque é que necessita de proteínas. Quem perceber, de maneira fundamental, porque gosta do que gosta, porque faz o que faz, porque erra da maneira que erra, e souber definir os seus comportamentos de acordo com a sua vontade, estará perto da omnisciência. Isto partindo do princípio que define precisamente qual a sua vontade, integrando (não sei como) as emoções. Que, por definição, não dependem de aspectos volitivos...
O condicionamento pavloviano não chega, e o condicionamento operante pouco mais é que tentativa-erro.

Não conseguimos mudar a nossa maneira de ser como gostaríamos, mas conseguimos fazer alguma coisa, que não sabemos explicar bem. Talvez seja só desejar com muita força. Talvez seja só uma ilusão.

Seja como for, é uma ilusão que não conseguimos abandonar. Por algum motivo estúpido, a nossa parte emocional fica menos ansiosa, se acreditarmos que a parte cognitiva controla os nossos comportamentos, o nosso futuro. 

Independentemente da conclusão a que chegarem, não me mandem emails a dizer que: ''a vida é o que acontece enquanto estás ocupado a fazer planos.'' ou ''se quiseres fazer deus rir, conta-lhe os teus planos!''. Consigo perceber que estas manifestações fazem parte da vossa natureza lamechas. Mas a minha parte emocional deseja que se sentem em cima de um pionés.
Read More »

domingo, 28 de setembro de 2014

Viddy well, little brother. Viddy well!

It funny how the colors of the real world only seem really real when you see them on a screen



Read More »

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

SUPER

Portanto acabei de ver um dos melhores e mais estranhos filmes que já vi ultimamente.


Basicamente adorei o Guardians of the Galaxy, que, incidentalmente ja fez 700 milhões de dólares em receitas worldwide, e fui à procura de outros filmes do mesmo realizador, o James Gunn.

O James Gunn começou a sua carreira cinematográfica com a Troma Pictures, que nos anos 80 e 90 fez vários filmes gore, nomeadamente a saga do super herói Toxic Avenger.


Depois realizou algumas coisas que eu ainda não vi mas que supostamente são muito boas, como o Tromeo and Juliet e o Specials.

O que eu vi de facto foi o Super.



Ora é razoavelmente difícil descrever o Super porque há imensa coisa a acontecer ao mesmo tempo.
De certa forma é um filme de desconstrução do conceito de super-heróis, no qual um homem normal decide vestir um fato de super-herói e combater o crime, a lá Kick-Ass, com o qual tem muitas semelhanças. 

Tem simultaneamente aspectos estilísticos de filme indie de baixo orçamento e de filme gore com baixo orçamento e com uma violência física muito, muito agressiva que provavelmente não é para toda a gente. E o filme tem todos os actores. O Kevin Bacon, a Liv Tyler, o Michael Rooker, até tem o Nathan Fillion FFS!

A narrativa não é nada de estupendamente inovador ou original, está lá só para permitir que as personagem centrais se revelem e cresçam. 
O tema central destas personagens é a insanidade, mais especificamente insanidade mental face a uma sociedade injusta e cruel.


O personagem principal é o Frank Darbo, aka o Crimson Bolt, maravilhosamente interpretado pelo Rainn Wilson do The Office americano.
Mas apesar de o personagem principal ser claramente doido, muito violento e mesmo homicida o filme não tenta desculpá-lo ou redimi-lo. No entanto as suas motivações são tão claras e compreensíveis que é difícil não empatizar com ele, mesmo quando está a partir a cabeça de pessoas que se metem à frente em filas. O facto de empatizarmos com este personagem torna-nos cúmplices dele. Ele faz aquilo que nós gostaríamos de fazer: sair e combater o crime, corrigir as coisas erradas na sociedade. Nós não o fazemos porque não somos doidos, mas ele fá-lo!


Depois há a personagem secundária, a Libby, aka Boltie, que é a geek que é demasiado intensa a gostar de banda desenhada. Se o Frank é quem gostaríamos de ser mas não somos, a Libby é quem somos, mas preferíamos não ser. 
A Libby é uma espectadora, é obcecada com banda-desenhada e super-heróis. Passa a vida a ler banda-desenhada e a desejar estar dentro das aventuras, com uma obsessão quase doentia. Naturalmente quando a oportunidade surge para participar de facto nisso, enlouquece um bocadinho e as piores partes vêem ao de cima.
Enquanto que para o Frank a motivação para combater o crime passa por um sentido de justiça e moralidade (mesmo que deturpado) para a Libby é uma coisa catártica, fetichista quase-sexual que vem da sua obsessão por super-heróis. É a sublimação do voyeur subitamente estar directamente envolvido nas suas fantasias. É desconfortável...

Sobretudo porque ela é a substituta do espectador, de nós. Nós somos os voyeurs. Somos os espectadores tanto das bandas-desenhadas como do próprio filme no qual a metáfora é apresentada.
E, como nós naquela situação, a vida corre-lhe mal. Ela não tem um colete à prova de balas feito de protecção narrativa. O Frank tem porque é o herói, ela não tem porque é a observadora.



De qualquer modo, e porque já não sei bem para onde é que ia com isto, o James Gunn é um grande realizador, muito subestimado.
O filme Super está extremamente bem construído, tem um excelente ritmo, todas as cenas o empurram para a frente e nunca são repetitivas.
Nota-se o mesmo tipo de técnica e domínio da narrativa e cinematografia que depois se viria a ver no Guardians of the Galaxy.

Read More »

domingo, 14 de setembro de 2014

A História do Papão

Eu, pessoalmente, culpo os vegetais.

Mais especificamente a agricultura. Esse foi o ponto de viragem.

Porque percebam, durante muito, muito, muito tempo, nós fomos caçadores-recolectores.
E quando digo "nós" refiro-me a seres humanos modernos.

Os seres humanos, o Homo Sapiens, existe e tem o aspecto que tem hoje desde há 200 000 (duzentos mil) anos. Éramos nós, humanos sem excepção.

E éramos caçadores-recolectores. E o que é que isto significava?

Significava que toda a nossa alimentação, aquilo que nos mantinha vivos, tinha de ser caçada ou recolhida na sua forma selvagem. Colhíamos bagas e frutos para comer quando estavam maduros, caçávamos gazelas ou bisontes ou mamutes quando eles migravam por perto, ou tínhamos nós de acompanhar a migração deles.


Era uma subsistência duvidosa, incerta, muito dependente de factores externos. E não morríamos sequer de maneira simpática, na caverna com os outros homens das cavernas.  Provavelmente morríamos assim:


"AAAAAAAAAAH AHHHHHHH AHHHHHHHA AHHHHHHHH ESTOU A SER COMIDO VIVO!!!!! AHHHHAHAA ISTO DÓI IMENSO!!! AAAAAAAAAAHHHHHHHHHHH!"

Devia ser mais ou menos assim. 
De qualquer modo, estávamos sempre à beira da fome e da morte.

Mas não dava muito trabalho. Caçavam um bisonte uma vez por mês e comiam-no até terem de ir caçar outro. E o resto do tempo? Provavelmente fornicavam muito, porque era a única maneira de contrabalançar a mortalidade enorme que sofriam. Ou faziam pinturas nas paredes quando se aborreciam, provavelmente.
E nós ficámos assim durante muito muito tempo, a viver desta maneira precária!

Foram precisos pelo menos uns 180 000 anos para que um dia, um desses humanos pré-históricos, se lembrasse de uma coisa melhor.

Imagino que tenha corrido mais ou menos assim.


Homo Sapiens Esperto (HSE): Ouçam, e se em vez de estarmos à beira de morrer à fome todos os meses, fôssemos ali abrir uns buracos no chão, pôr lá umas sementes, e tomar conta daquilo todos os dias até essas plantas crescerem e depois comêmo-las?
Homo Sapiens Idiota (HSI): Isso dá muito muito trabalho, acho que prefiro continuar a fornicar e a pintar as paredes.
HSEsperto: Mas se decidires prescindir dessas coisas e trabalhar muito, talvez em vez de andarmos sempre a morrer que nem tordos, possamos construir uma fonte renovável e confiável de comida com a qual podemos subsistir com mais segurança.
HSIdiota: Mas isso demora tanto tempo! E dá tanto trabalho! Eu prefiro correr o risco de morrer numa caçada selvagem todos os meses, do que sujeitar-me todos os dias a trabalho físico intenso, rigoroso e muito aborrecido! E tu já comeste essas plantas? Não sabem a nada! Prefiro carne de búfalo cozinhada nas brasas!
HSEsperto: Ouve... se estiveres disposto a parar de fornicar durante 5 minutos, podes ir lá fora, cavar uns buracos todos os dias, e os teus filhos e a tua tribo não correm o risco de morrer à fome de 15 em 15 dias.
HSIdiota: ... mas fornicar o dia todo!!!
HSEsperto: Ouve, estúpido, se tu não fores trabalhar no duro vão-te acontecer coisas más! Há um Papão, muito grande e muito poderoso! Que te faz mal, se tu não parares de fornicar e fores cavar buracos! BoooOOOO! Olha o Papão!!!
HSIdiota: mas como é que o Papão pode saber que eu estou sempre a fornicar?
HSEsperto: o Papão sabe tuuuudo! E vê tudo o que tu fazes!!! Eu sei porque ele disse-me! Portanto vá... cavar buracos...


Ok, se calhar não foi exactamente assim, mas o ponto é que, a determinada altura, depois do fim da última idade do gelo há 11 000 anos, os povos caçadores-recolectores do sudoeste asiático, médio-oriente e egipto começaram a domesticar espécies selvagens de trigo, lentilhas, favas, grão e cevada e a tomar um estilo de vida mais sedentário.

A agricultura é dura, dá muito trabalho, mas é segura (mais segura do que lutar contra tigres dente de sabre) e razoavelmente confiável nos seus resultados. 
Mas com a agricultura estávamos presos ao chão, deixámos de viajar. Com a agricultura começámos a acumular bens e, pela primeira vez, tínhamos mais coisas do que aquelas que conseguíamos transportar connosco.
Pela primeira vez tínhamos possessões em números grandes que podíamos comparar uns com os outros. Precisámos de números para contar o que tínhamos.
Pela primeira vez tivemos excedentes que podiam ser trocados por outros bens. Precisámos de letras para registar essas trocas.
Estas ideias de bens, comércio, economia, poder, estas consequências mecanísticas da mudança do nomadismo para um sedentarismo agrícola, foram a base da civilização humana como a conhecemos hoje.
A agricultura permite uma explosão populacional global, e estabilidade suficiente para que as primeiras cidades, estados, reinos e religiões organizadas possam começar a emergir. Estes estados primordiais eram usualmente teocracias, nas quais o poder político era justificado por prestígio religioso.

Pouco tempo depois, há cerca de 6000 anos, a escrita e a roda são inventadas, algures na Mesopotâmia e na Suméria e a evolução tecnológica e científica começa a acelerar a uma velocidade que nunca diminuiu desde então.

E não se esqueçam que isto tudo aconteceu mesmo mesmo muito recentemente! Fomos humanos durante cerca de 190 000 anos até que isto começasse a acontecer, e a história escrita só está registada desde há cerca de 6000 anos.

Isto tudo porque uns avós nossos decidiram meter medo uns aos outros com histórias do Papão. "Aquela bola de fogo no céu? É um sinal de que o Papão não está satisfeito e tens de cavar mais buracos", "A gruta desabou e matou a tua família? O Papão estava zangado contigo porque tiveste pensamentos de que ele desaprova, tu sabes quais foram...", "Não queres trabalhar o dia todo? Olha que o Papão zanga-se!", "Achas que a vida devia ser mais do que cavar buracos? Depois de morreres, se cavares muitos muitos buracos, e fizeres sempre o que o Papão manda, tens tudo o que queres! Como é que aproveitas se estás morto? Olha que o Papão não gosta de perguntas dessas..."

E nós somos os descendentes directos destas pessoas. Somos os descendentes dos que decidiram um dia parar de vaguear, parar de fornicar o dia todo, prescindir de muitos prazeres, arregaçar as mangas e trabalhar no duro todos os dias à espera de recompensas futuras. Somos descendentes dos que tiveram medo e decidiram jogar pelo seguro, dos que foram crentes e aceitaram ser obedientes. E quanto mais o fossem mais sucesso tinham, mais sobreviviam, mais netos tinham. Somos o resultado de uma selecção social que dava vantagem à obediência e à crença.

Temos todos medo do Papão.
Read More »